sábado, 1 de outubro de 2011

É TÃO TRANQÜILO SER MENOR...

Adoro o Twitter. Nele somos todos humanos, demasiados humanos. Não há lugar melhor para desabafos. É um verdadeiro confessionário! Outro dia uma prestimosa amiga tascou em tom de questionamento que estava “Triste como alguns "militantes" de partidos políticos se aproveitam de mobilização estudantil” em referencia as manifestações na UESPI. Respondo, por que isso ocorre, de forma direta e simples: é pelo mesmo motivo que as pessoas assistem o BBB. Calma! Explico melhor.

Segundo o Francês Jean Braudrilhar, as pessoas assistem o BBB, além da espetacularização, pelos seguintes motivos: porque são idiotas, porque nada têm para fazer, porque adoram espiar os outros pelo buraco da fechadura e porque se identificam. As respostas obedecem à mesma complexidade do programa. Por espetáculo como esse, podemos ser transformados em idiotas sem culpa e com direito a aparição na mídia. Percebeu a semelhança com os tais militantes de partidos políticos?

Você pode alegar que recorri a um filosofo pós-moderno, e que quase todos são relativistas, niilistas, indiferentes... Então me apoiarei em Kant, que é tido como um dos mais radicais pensadores da modernidade. Para alguns, a modernidade tal como pensamos hoje, não seria possível sem o seu pensamento. É um dos pilares da modernidade! Como seu pensamento é bem amplo, me atenho especificamente aos conceitos de maioridade e minoridade. Através deles é possível explicar porque “militantes de partidos políticos se aproveitam de mobilização de toda natureza, não só a estudantil.

Para Kant, alcançar a autonomia implica em abandonar a minoridade em direção à maioridade. Mas isso só é possível quando o individuo decide se servir do próprio entendimento sem está submetido a o entendimento de outro. A idéia é simples: a maiorias imensas das pessoas repetem o que os outros vivem. Vivem em função de conselhos alheios à sua experiência. Isso é viver na minoridade.

Agora viver na maioridade, pressupõe a coragem para pensar e deliberar sobre a vida a partir do próprio entendimento. É claro que por conta do nosso medo e de nossa covardia, tiranos se apresentem como tutores da nossa vida. Até porque, “é tão tranqüilo ser menor” diria Kant. Afirmo sem rodeios que o homem passa por um processo idiotização progressiva. Antes éramos mais obrigados a pensar. É só ir numa banca de revista e seus problemas acabaram. Basta observar a infestação de livros que começa com o a palavra “como”: Como ficar rico, como ter saúde, como fazer amigos, como ser feliz...

É uma proliferação de formulas tirânicas: na política, na religião, no comportamento, etc. Você não precisa pensar, lutar, protestar... tem um cara que me diz: o que vestir, comer, andar e até como fazer sexo... Isso evita que você pense e decida sobre sua vida. O Statu quo é “Para que eu irei me matar de pensar se tem alguém que pode fazer isso pra mim?” Perceba que ser menor é bem mais cômodo.

É difícil decidir sobre a própria vida.

Nessa questão, é impressionante a atualidade do pensamento Kantiano.

Perceba que os militantes que a incomoda, é apena mais um tirano, dentre vários...

Para quem não quer pensar, está tudo pronto e acabado!

Mas a pergunta é: o que se ganha em ser maioridade?!?!

Agora se resolver ser autônomo, com certeza irá incomodar muitos tiranos.

Junior

PROFISSÃO: TESTADOR PROFISSIONAL DE PROSTITUTAS

Insólito

O chileno Jaime Rascone é responsável pelo “controlo de qualidade” num bordel. Rascone, era um ocasional modelo masculino e DJ, quando no âmbito de um trabalho sobre a revolução sexual no país, conheceu a casa Fiorella (casa de acompanhantes de luxo), em Santiago (capital do Chile).

Nessa altura e porque estava a decorrer um processo de contratação de acompanhantes femininas, Jaime Rascone foi convidado a dar o seu “parecer” sobre quem deveria ser contratado. As candidatas que estão interessadas em trabalhar como acompanhantes VIP no negócio Fiorella tem que passar por entrevistas, testes psicológicos, e uma sessão de fotos.

No final as candidatas são reduzidas a seis, que então, tem sexo uma após a outra num único dia com Jaime. Ele toma notas após analisar como é que elas movem os seus quadris e se, os seus gemidos são ou não os adequados entre outras notas. Após, recomenda-as, ou não, à gerente da casa.

Mas não pensem que é fácil! A tensão do trabalho é realmente de tal forma que ele só pode fazê-lo uma vez por mês, testando em torno de 70 meninas por ano.

CHINESES CONFIAM MAIS EM PROSTITUTAS DO QUE EM POLÍTICOS

Insólito

Uma pesquisa realizada na internet sugere que os chineses consideram as prostitutas como uma das três categorias profissionais mais confiáveis do país, à frente, inclusive, dos políticos.

A pesquisa foi realizada pela revista Insight China entre junho e julho de 2009, com 3.376 cidadãos chineses.

Segundo a sondagem, 7,9% dos pesquisados consideravam as prostitutas confiáveis. Na lista geral, elas estão atrás apenas de agricultores e religiosos.

Oa militares ficaram em quarto lugar na lista de confiabilidade.

“A inesperada importância das prostitutas na lista de honra… é, sem dúvida, algo muito raro”, afirmou o jornal estatal China Daily num editorial.

“Uma lista como esta é, ao mesmo tempo, surpreendente e constrangedora”, disse o editorial.

Políticos ficaram bem abaixo na lista de confiabilidade, tal como cientistas e professores.

“Pelo menos (cientistas e autoridades) não ficaram entre as categorias menos confiáveis, que é formada pelos construtores civis/imobiliários, secretários, artistas e directores”, dizia o editorial do China Daily.

Fonte: BBC Brasil

CIENTISTAS DIZEM QUE MOZART MORREU DE... FALTA DE SOL!

Insólito, Investigação

Ao longo dos anos, investigadores ressuscitaram a história da morte de Mozart inúmeras vezes – ele já morreu, por exemplo, de febre reumática, tuberculose, derrame, septicemia, falência renal, broncopneumonia, choque hemorrágico e mais uma quantidade hipóteses.

Uma das teorias mais famosas, aliás, é a de que Mozart teria sido assassinado por um compositor rival. Mas a hipótese mais recente sobre os últimos dias do austríaco é que ele teria morrido por falta de vitamina D, que é produzida naturalmente pela pele quando exposta ao sol.

Segundo investigadores dos EUA e da Áustria, onde Mozart vivia, bronzeado ele não era, pois andava “tão noturno quanto um vampiro” no fim da sua vida, o que os levou a supor que a sua pele não produzia vitamina D o bastante. Como os suplementos vitamínicos só começaram a ser comercializados dois séculos depois… Isso, tê-lo-á levado à morte.

“Embora entender as causas da morte de Mozart não possa trazê-lo de volta“, apontam os estudiosos, astutos, “ensina uma lição aos europeus que vivem em grandes altitudes (e também a quem vive noutros lugares) sobre a importância da vitamina D”.

LÁGRIMAS DE RATO SÃO AFRODISÍACAS


Insólito, Investigação

Investigadores da Universidade de Tóquio descobriram que as lágrimas dos ratos machos contêm feromonas que as fêmeas acham irresistíveis.

Eles contam que os ratos lacrimejam bastante para manter os seus olhos húmidos, e aí as lágrimas — e as feromonas — acabam por se espalhar pelos corpinhos deles. Quando a fêmea entra em contato com a substância, o seu cérebro manda uma resposta que a torna três vezes mais propensa a copular com o “chorão”.

Tal não pode acontecer nos humanos.

SE DAQUI A MIL ANOS

Meus amigos daqui da Suiça não sabem o que é pobreza. Nunca viram. Tem uma dificuldade enorme de imaginar o que significa fome num contexto que não seja "tô com fome, vamos sair pra comer pizza?". Eles já viram na TV, de repente até na rua, e sinceramente acho que se esforçam pra ter a sensibilidade necessária. Mas não tem e não sabem.


Também não sabem o que é falta de educação, analfabetismo, exclusão social, preconceito de classe, nenhuma dessas palavras feias que teimam em denegrir a boa imagem da nossa nação. Outro dia eu disse pra eles que uma pessoa que trabalha ganhando menos de 1 dólar por dia está numa situação de escravidão, pois tem duas opções: morrer de fome, ou trabalhar 16h por dia pra ter agua semi-potável e eventualmente qualquer mínimo de alimentação. E essas não eram opções melhores do que as que um escravo tinha, e que ninguém nunca iria oferecer um trabalho melhor pra essa pessoa, porque a tal da mais-valia funciona, etc... (eles também nunca estudaram Marx no colégio e não sabem definir o que é socialismo nem capitalismo, a não ser a definição Fox News). Nisso, um amigo me interrompe: mas se é assim, ele pode abrir o seu próprio negócio, a não ser que exista um big-government que impeça ele de abrir um negócio. Ele pode abrir o seu próprio negócio. É esse o nível do desconhecimento, minha gente.

Muitas vezes nossas conversas acabam caindo no argumento da grande falácia natural. O argumento da falácia natural funciona assim: ao ser apresentado a qualquer grande injustiça causada pela sociedade o sujeito responde: olha, isso não tem nada a ver com o sistema, a natureza é que assim. Não é possível que todos tenham tudo e essa é a beleza do livre mercado, porque ele não deixa você artificialmente fingir que nós podemos ter o que na prática não podemos.


Antigamente, a minha resposta à grande falácia natural era sair gesticulando como o Zizek e gritando: é, faz todo sentido mesmo! Porque se eu virar pra você agora e dizer que a gente tinha que tentar colonizar Marte, montar um elevador pra Lua, ou construir uma árvore que dá chocolate você vai me dizer que é só uma questão de tempo e de esforço, porque o intelecto humano é capaz de qualquer coisa e que muito do que temos hoje já foi considerado impossível. Mas no momento em que eu falo pra você que nós temos que acabar com a pobreza e a desigualdade, você me diz que não há nada a fazer porque isso é impossível e está muito além da capacidade humana. Então ok.

Gosto muito desse argumento. Mas outro dia, meio sem querer, acabei dizendo outra coisa no lugar. E queria compartilhar com vocês o que eu disse.

A minha nova resposta pra grande falácia natural é: amigo, eu venho de um lugar chamado Brasil. Um lugar que tinha quase 50 milhões de pessoas vivendo em situação de miséria absoluta e hoje tem menos de 13. E de quebra, durante o mesmo período, fizemos o PIB crescer mais que 5% ao ano, com gente comprando geladeira e fogão, sabe? Não teve bolo pra dividir, não teve nada de natural. O que tem é que quando o pior de nós melhora, todos melhoramos. O mundo não é o que é, o mundo é o que a gente faz dele. E dá pra fazer tanta coisa.


E foi aí que eu percebi o que eu percebi e corri pro computador pra escrever o que estou escrevendo.

A saída de 30 milhões de pessoas da miséria foi e é de uma importância social e humana gigantesca. E creio que com efeitos que se propagarão por décadas, alterando profundamente as vidas das pessoas do nosso país. Mas isso eu já sabia. O que eu percebi é que essa mudança é muito mais que isso.

Porque ela é também a idéia. É o argumento de que podemos fazer mais pelo mundo e que não estamos fatalmente presos dentro dessa lógica umbiguista-cínico-mercadológica. Que apesar de não termos as respostas e de ser preciso humildade pra reconhecer que as decisões nunca são óbvias, não podemos descartar as perguntas. A história não acabou. O que o Brasil fez não foi só um avanço humano, mas de certa forma foi também um avanço histórico.

Daqui a mil anos, quando nada mais for como é, acho que alguém vai lembrar disso. Durante uma aula maçante sobre história do século 21, eles vão aprender sobre o que a gente discutia e se perguntar "mas eles não viam o que ia acontecer?". E alguém vai perceber que a gente não tinha como saber, não estava claro, mas mesmo assim a gente intuía, hesitava, e devagarzinho fomos descobrindo. E acho que vai estar lá. Eu sei que vai estar lá. Talvez como um micro ponto, uma nota de rodapé, um "é por isso que vale a pena vir na aula desse cara, porque isso não tem no livro". Mas vai estar lá que a gente fez alguma coisa diferente. Que não era tudo igual e que a gente tentou e demos uma dentro pra história, sabe?

E alguém vai levantar a mão e perguntar "mas psor, isso também cai na prova?". Porque a gente tá começando a resolver a pobreza, mas ainda tem muito chão pra resolver a educação.

Fernando Serboncini é engenheiro, trabalha no Google e mora em Zurique, na Suíça. É fascinado pelas coisas. Nasceu faz menos tempo do que parece. E erra muito.

O CAMINHO DA SOLIDÃO E OS PASSOS CURTOS DO AMOR


Vida e Estilo - Fragmentos da vida cotidiana


Reflexões a partir de Rilke (Cartas ao jovem poeta), Zigmunt Bauman (Amor Líquido) e Aaron Beck (Terapia Cognitiva).

“Por isso é tão importante estar sozinho e atento quando se está triste: porque o instante aparentemente parado sem nenhum acontecimento, no qual o nosso futuro entra em nós, está bem mais próximo da vida do que aquele outro ponto, ruidoso e acidental, em que ele acontece como vindo de fora.” Rainer Maria Rilke, Cartas a um jovem poeta, L & PM Pocket.

Outro dia, vi um amigo lamentar a solidão com grande pesar. Foram suspiros e agonizantes lamentações de quem tem a saúde mental por um fio delicado de alguma paixão não correspondida do passado e alguma eminente catástrofe escrita no futuro. Tudo por causa do Dia dos Namorados. Em seguida, agora em Agosto, o ouvir gemer em sofreguidão terminal de quem tem a vida ameaçada por doenças purulentas quando se aproximou o Dia do Solteiro. Ainda não liguei para saber notícias, mas pesquisei em alguns sites de relacionamento e um Nick em particular me chamou a atenção: Solteirão_Desesperado_Agoniza quer conhecer você, quase qualquer pessoa.

A internet vem funcionando para alguns como a salvaguarda de relações já fragilizadas, ou acentuação desses vítreos contatos (porque são delicados e não transparentes). Nos labirintos impessoais dela percorrem pessoas existindo com “intenção de ser”, que existem enquanto ideia. Reduzem e aperfeiçoam características irrelevantes, aprimoram mentiras divertidas, entregam o corpo para corromper o grande esforço que parece ser acreditar num relacionamento saudável, ou possível, ou, no mínimo, satisfatório. Então, as expectativas são aceleradas e tentam se tornar reais, encaixando-se forçosamente num espaço (estas ausências que só aumentam quando usamos o desespero de amarmos quem não queremos para preenchê-los) apertado que não comporta nem mesmo seus próprios mistérios. Quem procura desesperadamente quase qualquer amor parte para revelações propositadas numa comunicação desenfreada cujo conteúdo é etéreo, vago, como se falassem de amor-fumaça esperando o início de alguma fagulha.

Na internet, a capacidade de reinventar-se, ou inventar-se pela primeira vez, é proporcional à oferta de novos produtos a serem adquiridos. Assim, o “amor verdadeiro”, o real, aparentemente intocável, permanece intacto; a impressão é que por não ter dado certo da primeira vez (ou de todas as outras seguintes) não foi verdadeiro, e assim não foi real.

Os solteiros costumam ser injustamente rotulados de inseguros crônicos que, para não afundarem nas profundezas de uma decepção ou rejeição (apenas possível rejeição), evitam relacionamentos ou aproximações com homens e/ou mulheres (ou objetos e bichos que berram). Um solteiro não é uma ilha no pacífico com um vulcão adormecido com amargura e dor borbulhando aquecidas; solteirice ainda pode ser uma escolha, um momento de procurar um outro caminho, de experimentar com os amigos a contemplação de uma vida nova, de repensar valores e conceitos que foram plantadas antes de nem entenderem o que é amor.

Talvez os solteiros estejam buscando investimentos mais apropriados, algo que mantenha o desconforto questionável que pode ser “estar sozinho”, no entanto, continuam a sustentar um bom senso adequado para preparar sua solidão dentro de movimento calmamente decente que é apreciar outra solidão. A solteirice deveria ajudar o sujeito a despender mais tempo, reflexão com recheio de afeto, e não aceitar formulações sobre amor, família, amizade, futuro, emprestadas.

A solidão não será aflitiva se trouxer consigo a possibilidade de reflexão sobre ela própria. Da mesma forma que estar triste só será o massacre de um futuro se não tiver um valor de aprendizado, se não for encarado como um aviso importante de que mudanças precisam ser avaliadas.

Entendi cedo que minha solidão (como oportunidade, não como catástrofe) é um resgate do amor-próprio que deixei morrer em todas as iniciativas românticas falhas que presenciei. Não foram desastres; apenas diferenças. Ninguém sabe ao certo qual a coisa certa a fazer (que palavras usar, que carinhos iniciar, em que horários deixar o coração ceder, que declarações não nos tornará um amontoado de esperas histéricas e ressecadas), nem o tamanho do presente que se tornará um passado seguinte, a história que não começou, pois “namoro”, “relacionamento perfeito”, “amor” são conceitos formulados e dependem do que cada um pensa sobre eles; depende do entendemos deles.

Ou vai me dizer que você não tem aquele amigo que questiona a função dele no mundo, o sentido íntimo do seu valor no universo só porque chegou o Dia dos Namorados e ele está solteiro?

Procurar o amor ainda é aceitar estar sozinho com os próprios mistérios dentro da liberdade de outra solidão apenas compartilhada; uma solidão com repetição de equívocos possíveis, e que permitem o abandono de padrões antigos, formas vencidas de interpretar a vida.

Solidão também é amor enquanto descoberta; é abrir os olhos para uma preparação: a preparação de algo único que recebe em si outras alheias possibilidades, e que se altera, que se permite mudanças esclarecidas, livres, e sempre abertas a outras mudanças.

Penso que, ao contrário do que alguns pensam, solidão não é o abrigo úmido para decepções e frustrações insuperáveis que alguns carregam como fardo. Solidão é, sim, um vasto campo aquecido por decisões preparadas com maturidade e contestações dedicadas que correm livres como redemoinhos espertos que desarrumam a firmeza de qualquer natureza sem arrancar-lhe a beleza.

Tentar inúmeras vezes o amor que se desgasta em nós, cegamente, sem questionar-se, não é uma iniciativa que leva ao sucesso. A ideia de que cada vez que se tenta um novo amor prepara-se com eficiência para o amor seguinte não significa sucesso nas tentativas que virão, pois, na verdade, cada amor que virá, será novo, em outro contexto, e por isso diferente. As águas que lavarão seu amor estacionado no fundo do seu rio de águas turvas serão outras.

Neste ponto, a questão que merece certa consideração são namoros engatilhados como defesas contra a solidão. Na busca do “ser apenas um com o outro” encaramos a solidão como a próxima guerra que abalará nosso futuro, e então nos preparamos para o combate. Organizamos as linhas de frente com uma armadura de discernimento frágil, carregamo-nos de uma munição pesada de “aceitar a qualquer custo o que vier” e entramos em campo minado, esquecendo, porém, as armadilhas de insatisfação escondida, ainda na superfície de nossas escolhas, que explodirão quando o outro, este que aceitamos como íntimo, mas não único, discorda de nós, não faz ou aceita as escolhas que sustentamos, ou prefere Paula Fernandes ao invés dos concertos de Bach. E vamos sacrificando diálogos que salvam, fuzilando qualquer possibilidade de ajustamento e entendimento. Evitamos a solidão e ainda assim aceleramos um desastre íntimo.

Penso ainda que o elemento assustador na solidão seja a novidade; é estar amargando fora das expectativas alimentadas pelos doces conceitos dos outros.

O deprimente “Só é feliz quem namora, então não posso ser feliz sozinho” se torna o eco dos desesperados caindo eternamente no poço sem fundo da solidão que eles não entendem. Não suportamos o desconhecido que cresce em nós rumo ao amanhã, este bicho chamado futuro que vem como mistério e que tentamos decifrá-lo e dominá-lo com a convicção forçada com que tentamos adequar nossa ideia de amor às convenções.

Não me refiro a uma solidão fechada em si, que engole depois de ferozes mordidas nosso amor-próprio (amor-próprio que está longe de ser aquela emboscada que muitos criam enquanto brava resistência ao amor de outras pessoas) e capacidade de compartilhar individualidades, abrindo mão de um compromisso palpável com aqueles que pretendemos apreciar por muito mais tempo.

Expectativas irreais acerca de um relacionamento ou avaliações negativas extremadas a respeito de estar sozinho podem influenciar em suas atitudes para com a solidão. Então, ela pode transformar-se numa repetição de equívocos, quando deveria ser um estado que muda de forma e cor dependendo das iniciativas de quem o experimenta.

(Não quero limitar a ideia de solidão à solteirice. Pois não existem os solteiros convictos que experimentam outras solteirices com o desapego como ferramenta incontestável tanto para regular sua segurança como para ajustar sua sociabilidade?)

Então a tristeza, o amor, a solidão, a decepção não vêm de fora, dos outros; são desconhecimentos que fixaram residência em nós; só não conseguimos precisar o local da morada, não descobrimos que porta escolher para presenciar a revelação, que chave procurar. O futuro, a vida nova, o amor, a solidão: são de dentro pra fora.

Estar sozinho pode ser um exercício. Uma escolha passageira que pode favorecer uma mudança permanente. Dependendo do ponto de vista.

Estar sozinho é um dos caminhos que podemos traçar com sossego, paciência e uma esperança realista até o amor chegar renovado e satisfatório.

(Solteirão_Desesperado_Agoniza acrescenta a seu status: Minha solidão diz que cansou de ser sozinha. Quer outra solidão só pra ela. Todinha.)

Raimundo Neto

CREPÚSCULO DOS DEUSES


Arte e Entretenimento - Música Mais

O que é o limite da vida? Acredito que o limite seja aquele ponto em que a nossa vida chega e que temos apenas a opção de parar tudo que estamos fazendo e da forma como estamos fazendo – pois o próximo passo pode custar à própria vida.
Entretanto podemos morrer mesmo vivos, ou como os budistas dizem [principalmente a escola tântrica] – estamos morrendo um pouco a cada dia.

Porém qual o objetivo da vida de um artista? Sucesso, fama, dinheiro, reconhecimento, luxo, extravagância ou um misto de tudo isso e mais um pouco?

O rock nos oferece em abundância exemplos de artistas que vivem e viveram no limite de tudo, muitos deles pagaram com as próprias vidas, enquanto outros amargam o fundo de um poço que eles mesmos cavaram.

Cartola já cantou que “o mundo é um moinho”, um grande triturador de ilusões e sonhos, que é tão implacável quanto o tempo, que devora as coisas e lega a obra [se é que podemos chamar assim em muitos casos] de muitos artistas ao mero esquecimento. Sid Vicious e Kurt Cobain são exemplos de vidas extremas, nas drogas e no sucesso repentino – o primeiro tornou-se símbolo de um movimento [punk] e o segundo de uma geração [os anos 90], ambos, assim como Che Guevara, hoje estampam camisetas de milhares de jovens mundo a fora.

O líder do Nirvana tornou-se o grande porta voz da geração sem rumo dos anos 90, cantou o desespero do "fin de siécle" – disse o que todos queriam dizer, aos pais, aos amigos, ao mundo – suas emoções eram as de qualquer adolescente, em Seatle, em Nova Iorque, em Nova Déli, no Afeganistão, em todos lugares – estavam cheios de um vazio existencial, e o tiro que ceifou a vida de Kurt, tirou também um pedaço da vida de cada jovem.

Sid Vicious não, não serviu de arauto para os anos 70 (haviam outros), mas abusou de tudo por nós, nos levou ao limite [mesmo que falsamente, segundo alguns] da desesperança no futuro, nos fez enxergar a porção de lixo que há em cada um de nós, mas foi vencido pelas drogas (overdose no banheiro de sua mãe).

“É tão estranho, os bons morrem jovens, assim parece ser[…]”, cantou Renato Russo, como uma profecia mortal, que acometeu Janis Joplin, Jimmy Hendrix e Jim Morrison (o próprio Russo – embora por outros motivos), porém no caso de Vicious e Kurt, trata-se de falibilidade dos ídolos, ou seja, expõe assim a faceta mais humana dessas personas [isso mesmo, pessoas], pois nós as elevamos a condição de seres sobrenaturais, verdadeiros deuses e super-heróis.
Será que Kurt Cobain achou que o tiro que transpassou o seu cérebro não o mataria, só aliviaria sua dor? E Viciuos, será que achou que a overdose só atingia os fãs dos Pilstols, mas a ele não?

Muitas vezes canalizamos nesses ídolos tudo aquilo que queremos ser, vemos no outro a beleza que não vemos em nós, sofremos com a dor deles, rimos com seus sorrisos e nos realizamos com sua glória, mas eles se machucam também, são deuses de barro, quebram como nós e são finitos.

Michael Jackson também é um caso extremo, de rei do pop a bobo de sua própria corte, teve tudo nas mãos, o sucesso, o mundo, a fama, o dinheiro, mas não soube lidar com isso, estragou sua carreira e jogou no ralo todo o prestígio que tinha por caprichos não humanos.


Sua majestade brilhou mais do que o ouro de sua coroa, conclusão, tornou-se prisioneiro de sua própria vida, e como num espelho invertido, desejou mais os fãs do que os fãs o desejam no final de sua carreira.




Vicious, Jackson e Kurt, [os anos 70, 80 e 90 representados] – morreram e mostraram o caminho. Napoleão começou sua decadência após invadir a Rússia no rigoroso inverno [início do século XIX], Hitler fez a mesma coisa no meio do século XX [felizmente]. Karl Marx disse que a história se repete uma vez como tragédia e outra como farsa – isso soa não só atual, como profético.

Amy Winehouse também morreu seguindo a mesma estrada para a perdição que esses predecessores seguiram. E Amy é um caso curioso porque reunia características dos três citados. Amy tinha talento como Michael Jackson. Era auto-destrutiva como Sid Vicious. E era infeliz [suposição minha] como Kurt Cobain.

Amy Winehouse pareceu não acreditar na finitude de sua vida, acreditava que conseguiria preservar aquilo que ainda a sustenta, seu talento vocal – veja Jackson por exemplo, não conseguiu no final da carreira repetir o vigor de outrora, até nomes como Caetano Veloso (e Chico Buarque, João Gilberto, entre outros) declinam na qualidade com o passar do tempo (mesmo a qualidade deles ainda sendo superior a da maioria).

Amy com alguma certeza iria passar por isso também – pois seu estilo de vida poderia prejudicar tanto sua voz quanto sua capacidade criativa. Milton Nascimento já cantava belamente que “todo artista deve ir onde o povo está”, Amy Winehouse fez muitas vezes o contrário, fogindo dos fãs e ainda os agredindo – o que sempre foi um grande risco, tanto físico [Dimebag Darrell ex-Pantera morreu no palco] quanto para a carreira em si, uma vez que com o declínio da qualidade seu público poderia abandoná-la [Axl Rose do Gun N´Roses é um exemplo].

Lembrando também que Winehouse iria lançar seu terceiro disco – que seria a prova definitiva de sua carreira. Estou querendo dizer que o artista muitas vezes [e principalmente quando não gerencia sua carreira de forma correta], torna-se refém de seu próprio sucesso, e caso o mesmo não chegue, afunda-se ainda mais nas drogas –além da normal perda de poder criativo que chega com o tempo.

Talento é parte da capacidade que temos de agradar por longo tempo, agora genialidade é entrar para história, como Mozart e Beethoven (Bach e outros), que jamais morrerão, guardadas as devidas proporções, Kurt, Janis Joplin, Jim Morrison, Hendrix, Lennon, Elvis, Vicious, também não serão esquecidos, pois se neles faltou à genialidade, talento não faltou, para que suas obras se mantivessem vivas até hoje e seus rostos gravados em camisetas em todo mundo, agora te pergunto, será que em 100 anos ainda falaremos de Amy Winehouse ou veremos seu rosto estampado em camisas por todo mundo?



Marlon Marques Da Silva

SOCIEDADE DO CONHECIMENTO E ECONOMIA CRIATIVA

Ciência e Humanidades - Demografia

A sociedade capitalista (do desenvolvimento econômico a qualquer custo) tem como base a obtenção de lucro por meio da produção contínua e crescente de bens e serviços úteis ou supérfluos. Para incentivar o consumismo desenfreado, o capitalismo montou toda uma máquina de propaganda, não só através da mídia escrita, falada e televisionada, mas também nos outdoors, placas de loja em loja e de bar em bar e até na Internet.

Em uma situação de crescimento populacional, esta máquina de propaganda e consumo fez crescer o PIB do planeta e agora o mundo tem uma pegada ecológica que é 50% maior do que a capacidade que a Terra tem de se recuperar e renovar seus recursos. No ritmo atual, projeta-se que precisaremos de dois planetas para garantir os consumo da humanidade em 2030. O atual modelo é insustentável. Como então garantir a sobrevivência da biosfera (incluindo o ser humano e toda a biodiversidade terrestre)?

Alguns dizem “O mundo tem gente demais” e propõem diminuir a população. Outros dizem “O mundo tem consumo demais” e propõem diminuir o consumo. Há também os que querem diminuir a população e o consumo ao mesmo tempo. Existem ainda aqueles que denunciam as desigualdades e querem uma melhor distribuição da “riqueza”.

Contudo, distribuir simplesmente o consumo não resolve o problema da sustentabilidade ambiental, porque o consumo médio dos habitantes do mundo está acima da capacidade de carga do planeta. Uma coisa é certa: mantendo o atual padrão de produção e de consumo, a humanidade caminha para o suicídio e o ecocídio.

O que fazer então? Existem alternativas?

Serge Latouche, por exemplo, defende a idéia do “decrescimento sustentável”, pois acredita que mesmo a idéia do “desenvolvimento sustentável” é inviável. Ele defende uma vida mais simples, com menor consumo por pessoa e uma sociedade que respeite os limites dos recursos naturais. Ele propõe um ciclo virtuoso de decrescimento, por meio dos seguintes conceitos: reavaliar, reconceitualizar, reestruturar, redistribuir, relocalizar, reutilizar e reciclar.

Autores como Herman Daly e Manfred Max-Neef defendem a idéia da “condição estável” (retomando um antigo conceito econômico do “estado estacionário) e combatem o chamado “crescimento deseconômico”, que é o aumento na produção que provoca um custo em recursos e em bem-estar maior do que o dos itens produzidos.

Sem dúvida, estas idéias que questionam o crescimento ecologicamente insustentável são importantes para se pensar em alternativas ao modelo econômico consumista da atualidade. Reduzir a pegada ecológica do ser humano é uma necessidade inadiável.

Porém, paralelamente à redução do consumo conspícuo e supérfluo e à diminuição das atividades econômica que danificam e poluem o Planeta, pode haver o crescimento de atividades que sejam ecologicamente neutras ou sustentáveis. Refiro-me às atividades culturais, científicas, afetivas e de conhecimento que não são baseadas no consumo material, mas sim na produção intangível e imaterial do conhecimento.

A “sociedade do conhecimento” é uma alternativa à “sociedade do consumo” na medida em que a essência do seu modo de funcionamento tem como base a “massa cinzenta” (cérebro) e não requer fronteiras delimitadas pela propriedade privada local e pelos nacionalismos, já que é uma sociedade desterritorializada. A arte e a sociedade criativa podem cresce sem danificar o meio ambiente.

Para que seja realmente sustentável esta sociedade pós-desenvolvimentista requer a democratização e o livre acesso à informação e ao saber. A inteligência é ilimitada, assim como ilimitado pode ser o seu uso. A sociedade do conhecimento não está sujeita às “leis dos rendimentos decrescentes”. Portanto, o livre conhecimento não restringe e nem é restringido pelos “limites terrenos do crescimento”.

As atividades do livre pensar e o exercício do conhecimento não tem limites e podem crescer de maneira ecologicamente sustentável. A economia criativa, que tem como matéria-prima o intelecto, vai se sustentar no combustível da contribuição voluntária e no prazer de realizar coisas novas e reinventar constantemente o mundo em que vivemos.

José Eustáquio Diniz Alves

A SENSIBILIDADE E A INOCÊNCIA DO MAL: HITLER, KORN E BLACK BOX RECORDER

Arte e Entretenimento - Música Mais


O argumento desse artigo é de que “o mal pode ser sutil e sensível”. A idéia é que uma coisa ruim pode se travestir de inofensiva, como nas armadilhas dos desenhos animados – é só lembrarmos de Coiote e Papa-léguas, quantas vezes o Coiote montou armadilhas para o Papa-léguas lhe oferecendo alpiste (sua comida preferida)? Era uma coisa boa com uma má intenção por trás. Num mundo de aparências como o nosso, não é prudente acreditarmos em tudo o que é belo e bom – (Platão diz que tudo que é belo é bom), quantos casos já não ouvimos de pessoas que param na estrada fingindo estar com problemas mecânicos no carro, alguém para pra ajudar e é surpreendido por um assalto. Ou ainda, pessoas que se oferecem para ajudar idosos para no final assaltá-los, ou até matá-los. A beleza pode esconder muitas coisas, e a bondade muito excessiva também, afinal porque será que existem ditados como “por fora bela viola, por dentro pão bolorento” e “quando a esmola é demais o santo desconfia”? A banda norte-americana Korn e a inglesa Black Box Recorder se utilizaram desses recursos em seus discos de estréia. Da capa a algumas canções, é tudo inofensivo – há diálogos com o mundo infantil, com a inocência, para que as más intenções não sejam percebidas, pois quem irá desconfiar de algo belo e sutil como uma criança? O mesmo artifício usou a bruxa má no conto “A bela adormecida” – travestida de mendiga[1](aparentemente inofensiva) – deu a bela jovem uma maça envenenada. Quem no lugar da moça iria desconfiar de uma velhinha inocente e de seu ato gentil? O mal assume diversas formas, é o caso do Diabo: “a idéia de que o maligno podia assumir qualquer forma que desejasse também foi fortalecida pela comparação de Satanás com a serpente que tentou Adão e Eva”[2] – porém uma das formas mais utilizadas por Satanás é a sua original. Lúcifer foi um dos anjos mais próximos de Deus antes da queda, e o significado de Lúcifer é anjo de luz (ou o “portador da luz”), e como diz Paulo em sua segunda epístola aos Coríntios, “Satanás podia transformar-se num anjo de luz para poder nos ludibriar”[3].


A capa do primeiro disco do Korn (homônimo), traz uma menina brincando numa balança num parque assustada ao ver uma pessoa que segura algo na mão direita. A pessoa não aparece na fotografia, vemos apenas sua sombra projetada no chão, iluminada pelo sol, mas olhando melhor, a pessoa segura algo nas duas mãos, não apenas na direita. Porém nessa mão o objeto – um estribo de montaria[4] – forma um símbolo ambíguo, que tanto significa o culto ao heavy metal, quanto ao demônio [em outras interpretações]. O encarte do disco do Korn apresenta brinquedos infantis – bonecas – em meio a revistas adultas, numa relação da perversidade da pedofilia, que muitas vezes ocorre pelos próprios pais – figuras de quem a criança não desconfia que irá lhe fazer algo de ruim. Duas músicas em especial demonstram essa perversidade camuflada, a última faixa “Daddy”, possui alguns elementos dessa relação. O começo algo meio sacro, uma levada hipnótica, sugerindo um quarto escuro, vozes, um clima pesado, meio Roman Polanski. A música é bastante tensa, só que não é tão pesada quanto as demais, é mais climática e os vocais de Jonathan Davis são emocionais e ora sussurrados, trazendo a tona uma inocência, ou uma violação dessa inocência. A proposta é de cantar algo macabro e perverso de uma forma sutil, assim como fazem em “Shoots And Ladders”. A música é cheia de referências malignas, de fundo um canto suave, um ritmo cadenciado, levemente pesado [sic]. A letra na primeira estrofe fala de morte (Roda em volta das rosas, bolso cheio de flores, cinzas, cinzas, todo mundo cai), a composição segue a mesma estrutura dos contos infantis, numas das partes a música diz: “três, quatro, feche a porta”, e em outra, diz: “dê um osso ao cachorro, esse velho veio rolando até em casa” – seria a mesma pessoa da capa do disco, perseguindo as crianças desde o parque? Entretanto há duas partes muito sinistras nessa música – e o detalhe, quem ouve a música sem saber o que diz a letra, é levado a pensar que trata-se de algo bom – logo depois da contagem, a canção prossegue com o verso: “A ponte de Londres está caindo, está caindo, está caindo, a ponte de Londres está caindo, minha bela senhorita”, não há como negar que a estrutura não é de músicas infantis. Em seguida, uma assustadora sentença: “Cantigas de crianças são ditas, versos em minha cabeça. Durante a minha infância eles foram ensinados. A violência escondida é revelada, uma obscuridade que parece real. Veja nas páginas a causa de todo esse mal”, essa mesma passagem consta no interior do encarte do disco, ao lado, vê-se um boneca sendo atacada por um escaravelho, numa referência a maldade contra crianças. Shoots And Ladders é uma música que fala sobre morte e pedofilia, sobre a forma como o mal pode estar nas coisas mais inocentes, o encarte ainda explora a faceta mais macabra dos brinquedos infantis, o olhar de assassinas ou de cúmplices das bonecas, tesouras jogadas, como quem esperando uma oportunidade para atacar, aliás, os brinquedos são os melhores amigos das crianças não é?


O Black Box Recorder também joga com essa questão de inocência e perversidade – os instrumentais de John Moore e Luke Haines são doces e sutis, enquanto que a voz de Sarah Nixey é suave como de uma criança, embala-nos em sonhos amargos e cheios sombras. Assim como o Korn, o Black Box também trouxe referências logo na capa e no encarte do primeiro disco, “England Made Me”. A capa traz uma bela e doce criança deitada numa cama, porém a menina olha para baixo, parece triste, sua tristeza reflete o tom amargo e depressivo da vida do final do século XX (o disco é de 1999). No quadro na parte inferior da capa, vê-se um acidente, um avião caindo no mar – seriam as letras as recordações da caixa preta (black Box) desse avião? – e ao lado um homem, provavelmente um comissário de um trem (se é que existe), que acabou de bater e está em chamas. Lê-se na placa, “Life is Unfair” (A vida é injusta) – ou seja, ocorreu um acidente, e os parentes dos que morreram (ou até mesmo os mortos num outro plano) certamente devem ter se questionado do porque ocorrera, logo com eles, então chegam à conclusão de que a vida é injusta. Porém se juntarmos uma coisa com a outra, depressão e tristeza (da menina) mais morte e desilusão com a vida (quadros da capa), é igual a suicídio. Abrindo o encarte, se vê uma bela paisagem, um penhasco com vista para o mar, abaixo muitas pedras a uma altura imensa – uma sugestão, um convite ao suicídio também, é outra chave dessa questão muito presente na iconografia do Black Box Recorder. “O disco derrubou a crítica no chão por seu excesso depressivo” observou Marcel Plasse[5], canções como “Swinging”, “Hated Sunday” e “It´s Only The End Of The World”, trazem também elementos depressivos, algumas como Hated Sunday, dão a entender que trata-se de uma saudade, de um tempo, ou de uma condição que não se tem mais, é como se alguém tivesse se matado e hoje estivesse relembrando (novamente aqui num suposto outro plano), como em “Memórias Póstumas de Brás Cubas” ou no filme Beleza Americana. Essa mesma impressão se tem ao ouvir a primeira faixa “Girl Singing In The Wreckage” – há um certo desconforto com a vida, uma sensação de fim – A. Alvarez comenta que o suicida “joga sua vida fora para poder, enfim, viver direito”[6]. Outro ponto das canções do Black Box é a sutileza dos instrumentais, “Swinging” é quase uma canção de ninar – talvez a que a menina ouvia na cama na capa do disco – enquanto que “Ideal Home” tem uma levada de pianos de brinquedo, uma atmosfera de quarto de criança, de silêncio inviolável, sem contar a voz de Sarah Nixey, proposital e perversamente infantil. Porém o grande momento do disco fica por conta da sexta faixa do álbum, “Child Psychology”, um tratado sobre a depressão e sobre as vidas destruídas das famílias que se dizem normais. A música “foi banida das rádios inglesas e teve seu clipe vetado na MTV, graças ao refrão: (a vida é injusta, mate-se ou supere isso)”[7] – e mesmo antes da retirada de circulação, a música teve seu refrão censurado. A letra da música fala de uma garota chamada Julie, que levava uma vida tediosa, turbulenta, presenciando brigas de seus pais e a mesmice da vida desses tempos. A menina tinha parado de falar, havia expressado seu desgosto com a vida (não queria ter nada mais a ver com o mundo lá fora), seus pais a levaram a médicos na tentativa de resolver o problema (fonoaudiólogos e psicólogos), mas nada disso adiantou, foi expulsa da escola por sua falta de interesse nas aulas – e talvez no futuro em si – isso nada significou para ela. Essa história foi contada sobre uma base instrumental simples, suave, com pequenos efeitos de sinos de berçário, um fundo tenso e amargo no ar, Sarah contando e não cantando exatamente, exceto no pesado refrão. O Black Box expôs a todos um problema quase oculto na sociedade, o reflexo dos problemas domésticos nas crianças, briga dos pais, violência, problemas financeiros, conflito de gerações, tudo isso acontece, mas as sociedades fecham os olhos para não ver, então quando alguém ou uma banda diz isso dessa forma tão franca e sutil como o Black Box Recorder fez, ou é boicotado ou censurado. Esse tipo de mensagem é quase subliminar, nos diz mas não de forma clara, nas entrelinhas, só que nesses casos aqui citados, a forma utilizada foi a inocência do mundo das crianças, assim como acusam Walt Disney e Xuxa de inserirem mensagens satânicas em seus desenhos e músicas respectivamente, talvez o mal pense que dessa forma não iremos desconfiar, afinal, como pensar que coisas tão belas e encantadas são tão perversas, isso não se passa na cabeça dos pais na hora de escolher um brinquedo ou um filme infantil para seus filhos pequenos.



Falar de Adolf Hitler hoje tornou-se fácil pela quantidade de biografias, documentos, artigos, filmes e comentários que foram produzidos a seu respeito. Muitos tentaram analisar sua mente e sua vida atrás de pistas que nos levassem a entender como ele foi possível, como pode acontecer tamanha monstruosidade. O mesmo questionamento pode-se dizer de Joe Fritzl – as pessoas jamais desconfiariam que um pai fizesse o que ele fez com uma filha, uma brutalidade, o mesmo se diria então do jovem Hitler se o analisássemos através de suas telas. É sabido pela história que a academia de belas artes de Viena recusou seus quadros e telas por considerarem suas peças insuficientes e de qualidade inferior aos rigores da grande arte e das academias. Porém hoje, sabe-se que suas obras possuem algum valor – foram a leilão algumas telas de sua autoria, valendo cerca de duas mil libras no total. Porém se analisarmos mais atentamente, não está só em questão o fato de ser uma tela de um dos principais personagens da história (para o bem ou para o mal), mas também há qualidade, média segundo Herbert Weidler, dono da Weidler Auction House, promotora do evento (o leilão). Realmente, as telas em questão mostram uma certa sensibilidade no autor, uma visão no mínimo sóbria do mundo, e principalmente num mundo em guerra – algumas dessas telas foram feitas entre as décadas de 10 e 20 do século XX. Os traços de Hitler são leves, porém firmes. Não se vê nos traços a força com que comandaria a Alemanha anos mais tarde, e muito menos o ódio que expressou pelas minorias que tanto lhe desagradava. A aquarela “Farmstead” de 1914, mostra um autor um tanto tradicionalista, pois não há diálogo com as vanguardas artísticas desse século (e dessa época), como a arte de Duchamp ou Mondrian. Pelo contrário, essa aquarela se parece mais com o trabalho de Turner e com ecos no fundo das paisagens de John Constable. Claro que não chega perto desses dois grandes mestres, mas não há como negar um mínimo de ressonância desses no jovem Hitler – provavelmente inconsciente (ou não – sabe-se sobre seu apreço pelas artes). Outra aquarela do jovem Hitler mostra um homem sentado em uma ponte, o quadro é belo e simples, pintado em cores leves, passa uma sensação de paz e tranqüilidade. O especialista em documentos históricos da empresa Mullock´s, Richard Westwood-Brookes, disse: “as pessoas esperam que suas pinturas reflitam imagens agressivas, temas militares, batalhas e gente sendo assassinada, mas não há nada em sua produção que sugira isso”[8], ou seja, se alguém que nascer hoje e não souber da história do autor e for desafiado a imaginar o que alguém que pintou tais telas fez nos seus anos seguintes, provavelmente a resposta não será tornou-se um ditador e comandante de uma das maiores tragédias de todos os tempos – o holocausto. Talvez se fossemos aproximar Hitler de algum artista, olhando pela ótica do que ele fez e do reflexo disso em sua obra – Francis Bacon seria o mais apropriado. Como o mal pode ter sido sensível? Como um artista pode se tornar um megalomaníaco comandante de uma tragédia como o holocausto? Como ele pode se tornar tão perverso, sendo que seus trabalhos artísticos nada revelam sobre essa sua faceta, como disse Westwood-Brookes? Isso nos mostra que o lobo na maioria das vezes vem em pele de cordeiro, e coisas aparentemente boas podem ser ruins na essência. A semente do mal pode ser cultivada sem que percebamos, portanto é necessário estarmos sempre atentos a tudo, ao mundo que nos cerca, as relações humanas, pois as vezes levamos inimigos para casa pensando serem nossos amigos, as vezes compramos gato por lebre e no final da história sempre ocorre algum malefício para quem não percebe o perigo iminente em atos, gestos e conjunturas sociais. Portanto fiquemos atentos aos desenhos de nossas crianças, vejamos o que querem dizer, pois as vezes por trás de rabiscos simples e tortos, estão traços de uma personalidade ruim e maléfica, e assim como não desconfiaríamos de um pintor com a sensibilidade de Hitler ou de letras de música evocativas do universo infantil, não desconfiaremos das crianças, mas veja nas páginas da infância a origem de todo mal.

Marlon Marques Da Silva

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Notas.

[1] WARNER, Marina. Da Fera à Loira. São Paulo: Companhia das Letras, 1999. p.255.

[2] O´GRADY, Joan. Satã, O príncipe das trevas. São Paulo: Mercuryo, 1991. p.55.

[3] Ibid.

[4] BRAGATTO, Marcos. Korn – Música nervosa para pessoas nervosas. Rock Press. Rio de Janeiro, Nº 04, p.25, abril. 2000.

[5] PLASSE, Marcel. Black Box Recorder. Showbizz. São Paulo, Nº 05, Edição 190, p.12, maio. 2001.

[6] ALVAREZ, A. O Deus selvagem. São Paulo: Companhia das Letras, 1999. p.115.

[7] PLASSE, Marcel. Idem.

[8] Quadros pintados por Hitler são leiloados no Reino Unido. O Estado de São Paulo, São Paulo, 23 de abril. 2009. Caderno 2/Variedades.

MACABRA NOSOGRAFIA OU TEOLOGIA NEGATIVA

Ciência e Humanidades - Outros Critérios

O que se pode sentir diante de um corpo que se vê sendo morto?

Existe uma misteriosa conexão entre as coisas do Universo – pensou o rapaz logo após ver um filme (não um rapaz, qualquer) – e de fato – julgou em sua louridade – o meu isqueiro tem algo de um nariz bojudo à francesa. E os dois juntos dançam com os ângulos das linhas da mesa. A ponta da colher cabe no bico do seio. Algum grego louco – pensou em suas lisas madeixas – pensou antes de mim que todas as coisas estão em todas as coisas.

(1) Dois são os movimentos do pensamento.

Três Urubus próprios, porém xarapins, impróprios, sorridentes, acham graça, pela Presidente Vargas, que o número um comece Um-Soberano número dois. Porque em qualquer operação que mereça esse nome “operado” há que ter alguma obsessividade com os números. E como em toda concentração repressiva – Deus assim queira – algo do dito espirituoso permita que um adorador de carniça possa rir. Eu sou aquele que é.

O primeiro se confunde com a propriedade e o segundo com a impropriedade. Na propriedade o pensamento se torna abstrato e alcança um estado em que as coisas estão em todas as coisas. No segundo o pensamento se torna específico – mas não concreto – e uma coisa passa a não se confundir com outra. No mais das vezes estamos entre a propriedade e a impropriedade. No mais das vezes algumas coisas estão em todas as coisas e algumas outras – mas não todas – não se confundem com outras.

Mas seria possível induzir o pensamento? – perguntou a ratazana ainda com um pedaço de carne nos dentes.

O pensamento não pode ser induzido, tal como se pode induzir um incêndio. Mas ele pode ser descrito em circunstâncias de pensamento. Elas se dão em graves quebras de pressão. Quando todas as coisas estão em todas as coisas – este pequeno objeto a passa a ser a única coisa que existe e com nada se confunde. Quando apenas este pequeno objeto a existe – algo o absorve e todas as coisas passam a estar em todas as coisas. A propriedade exclusiva é percebida numa espécie de grande delírio. Ou num delírio grande por detrás das coisas.

Seriam os gregos delirantes por detrás das coisas? – perguntou a ratazana agora palitando os dentes com um palito de restaurante do centro da cidade.

Mas a impropriedade exclusiva é a parteira dos engenheiros ou dos colecionadores de macabrices. Uma parteira de gêmeos. (Gêmeos, gêmeos – alguém falou em gêmeos, gêmeos: há que se chamar a parteira de gêmeos). Ao mesmo tempo em que dá a vida ao colecionador de parafusos para usos futuros. Dá a vida ao colecionar de parafusos sem uso. De um lado o exterminador de poetas. Do outro: o poema exterminado.

(2)

O rei Davi preparado para invadir Jerusalém – que antes era conhecida como Jebus – cidade dos urubus, talvez? – ouviu dos jebuseus que não seria capaz de entrar. Eles disseram a Davi que os cegos e os coxos seriam suficientes para repelir os seus exércitos. O rei Davi que apesar de seus belos cabelos ruivos não era nenhuma florzinha de laranjeira, tomou o desafio dos cegos e coxos como afronte.

Eu sempre gostei dos cegos e dos coxos – disse o Urubu xarapim. Ao que o narrador também foi remetido a sua simpatia por pernetas, não exatamente coxos. Muito embora fosse de uma família patriarcalmente coxa não conseguia deixar de demonstrar o assombro quanto a uma perna deixada para trás poder conter uma meia. Esse cuidado o comoveu o suficiente para um choro convulso de alguns minutos.

O rei Davi disse a seu exército que subisse o canal de água, dentro do qual poderia caminhar até mesmo um homem de um metro e setenta (quase dois, penso o Urubu prendendo o riso) sem abaixar a cabeça. E dentro da cidade dos urubus deveriam matar os oponentes com especial atenção e crueza aos cegos e coxos. Nem cego nem coxo entrará nessa casa – foi o que o rei Davi disse uma vez conquistada a cidade. Claro que o rei Davi pensou que uma vez que pudesse entrar e matar os coxos e cegos pelo duto d’água, por ele também se poderia fugir.

(3)

- três baratas grandes e cascudas interromperam o seu passeio matinal para ouvir a descrição do velho Zaratustra, ele dizia:

Há um tipo de homem que combate dentro de muros de casas pobres e que por vezes morre de tiro nas costas da cabeça. Um tipo de homem que combate dentro de muros de casas pobres. Nome de vegetação rasteira. Providência! Genérica plantinha! Um tipo que foge do modo pensado pelo rei Davi. Um tipo coxo e cego, até mesmo sem perna. Mas com o cuidado e carinho para deixar a meia. Este tipo de homem que anda de meia pela casa. Acaba por ser um tanto escravo de seus muros. Ele não pode sair quando quer. Lida com as armas que fazem fogo como se fossem brinquedos. Ou seria com brinquedos como armas que fazem fogo? Esse homem se faz lídio ao olhar para telas quadradas que emitem luzes e ao segurar um pequeno bastão nas mãos, move personas e animais e baratas como estas que me escutam e ratos. Não pode sair de seus muros, por perigo de ser abatido. É movido dentro de móbeis protegidos. Nas suas veias e narinas correm substâncias demoníacas. Nas suas camas dormem moças e moços e moças e moços. Escutem o que digo, baratas. Devo dizer o seu nome.

- Ele diz muito baixo e as baratas protestam: – diga logo Zaratustra.

Ao que limpa a garganta e levanta a voz:

- Menino de classe média – disse constrangido. As baratas também envergonhadas pela obviedade futura continuam seu passeio matinal. Uma delas persegue homologias. A outra mais objetiva procura um parafuso para fazer poema. Afinal, uma guerra é feita de partes de homens.

Cesar Kiraly