quinta-feira, 15 de abril de 2010

INÚTEIS REFLEXÕES

A história do homem conta-se pela história da natureza. Toda a sua vida reflete uma busca do natural, por mais que o cultural tenha interferido e provocado a cisão, da qual o homem se ressente na modernidade do nosso tempo histórico.
Quebramos alguns vínculos importantes, desacreditamos nossas necessidades fundamentais em nome de uma "segunda natureza", que nos oferece o fastidioso paraíso das bem-aventuranças do consumo. Nossas necessidades já não são nossas; são as que nos dizem que precisamos ter para sermos 'modernosos' e elegantes.
Fomos empolgados por uma mídia gananciosa, que projeta sobre as nossas cabeças o grande ideal do mercado, que pouco nos diz e mais nos artificializa.
Hoje perguntamos: porque ocorre uma incidência tão alarmante de pessoas deprimidas em nossa sociedade? O Dr. M.Seligman, Ph.D., apresentou algumas opiniões sobre o recente aumento da depressão. Alguns já chegam a denominar o nosso tempo de "Era da Melancolia".
Dois fatores são apontados para esse acontecimento:

primeiro, a crescente exaltação do "eu", enfatizado como fonte de maior significado, valor, estima e satisfação existencial. Com isso, surge um senso diminuído de comunidade e, conseqüentemente, uma redução de propósitos elevados.

segundo, a dissolução de alguns fundamentos, até então básicos, no processo de organização institucional da sociedade - Família, o Estado, Religião - que somada a exacerbada ênfase no "ego", resultou em uma epidemia de depressão.

Comprenda-se que o processo dissolutivo resulta da transição da sociedade, pela introdução de novas tecnologias, novos padrões de consumo, de lazer, do novo modelo de sexualidade, do poder político assinalado pelo estigma da corrupçáo, a manutenção de "fórmulas anacrônicas" e a secularização de instituições religiosas... E tantos outros fatores que paulatinamente alteram os costumes e transformam os comportamentos sociais, num "vale-tudo porque eu sou mais eu". Um tempo que cabe numa sentença de Sartre: "o inferno são os outros."
Excessiva devoção ao "eu" e devoção de menos ao bem comum. Essa a raiz da desarmonia que se assinala na nossa vida e na nossa sociedade.
O meio propício para que esta raiz seja forte, é a ascendente linha materialista que comanda a sociedade, cujo grau de pressão externa sobre o indivíduo, não permite que ele se volte para o seu reino interior.
Corremos atrás de miragens, de fantasias, porque já não conseguimos acreditar que a simplicidade possa nos oferecer um estado de bem-estar. Afinal, a simplicidade consiste no despojamento das inutilidades e do excesso. Ser simples é uma tarefa extenuante, porque é o exercício de uma disciplina que nos orienta para o essencial. Ou como diria Sócrates, ao apreciar o mercado do seu tempo: "Quantas coisas de que não necessito!".
É pensando numa filosofia  da "descomplicação", ou talvez dito melhor, numa visão de mundo menos complicada, sem ser simplista, reducionista, que muitas vezes ocorre-me observar os disparates da ganância, da desonestidade, da precária situação dos poucos valores que ainda flutuam à superfície do oceano social.
Tudo bem... Vivemos um momento intensamente trágico, violento, em que assistimos a transição de padrões, referências, comportamentos, políticas, e nos esforçamos por sobreviver e encontrar novos paradigmas que possam servir de bússola para um Norte mais suportável.
Todos os nossos modelos caminham rapidamente para a obsolescência. Estamos diante de novos fatos científicos, muitos deles polêmicos e sem uma perspectiva de avaliação histórica do futuro. Não podemos medir as conseqüências do desdobramento de tais fatos. A clonagem, os trangênicos, a gestação "in vitro" etc, despertam o receio do futuro, para o qual somos empurrados pela sofisticação de uma racionalidade científica, cujo controle escapou dos mecanismos éticos e institucionais ordinários, a essa altura dos acontecimentos refletindo em suas leis o espaço institucional legal do do século XIX e XX.
A ciência desenvolveu-se, avançou e detonou o meio ambiente, as relações sociais, as relações legais, as relações humanas, as relações políticas, banalizando as crenças e tabus em que se firmava o universo humano, tornando a violência um elemento do nosso cotidiano.
Mas devemos continuar... Não importa saber se a mudança é boa ou ruim. É um fato histórico, irreversível.
Discutir a sua natureza, estabelecer critérios e juízos, reformular princípios e promover uma ampla reforma jurídica adequada ao nosso tempo, em todas as suas esferas, deve ser a nossa ocupação, que delegamos aos que controlam o poder no Estado, já que será o nosso grande desafio.
Reequilibrar o poder político, fazer prevalecer o humano sobre o econômico, implementar políticas sociais includentes, distribuindo de modo justo a riqueza que se produz no país, esse o caminho, suponho, para um novo paradigma social.
Os que ainda não se deram conta de que sopram novos ventos vindos do futuro, fiquem alertas... Quem viver verá!

M. AMERICO

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