Consagramos a data de 25 de dezembro como o nascimento do salvador, o mestre que fundou a civilização judaico-cristã, cuja marca essencial deveria residir no amor ao próximo, no "ama o teu próximo como a ti mesmo".
Eu disse "deveria" ser o fundamento da nossa crença. Se tal tivesse acontecido, o que teria sido a nossa civilização? O que seríamos nós, nesses tempos de penúria de Amor?
Não me atrevo a responder. Minha imaginação não alcança a resposta certa para tal interrogação. Contam os filósofos e perquiridores da 'verdade' em suas utopias, histórias de um ideal de sociedade que resolveria os conflitos e as guerras pelo poder.
A Nova Atlântida (Francis Bacon), A Cidade do Sol (T. Campanella), Utopia (More), Callipolis (Platão) e Rousseau, e Marx... Pensadores que buscaram respostas a diversidade política das organizações humanas.
Ouço dizer que sem a ganância, não haveria prosperidade, o que significaria afirmar que o Amor, como virtude máxima, não conduziria o homem ao progresso.
Fica entendido assim, que a ganância é um sentimento de exclusão, de competição, o que atiçaria o sentimento de propriedade, de posse, de desenvolvimento dos recursos naturais disponíveis.
O amor compartilha, divide o "pão", coletiviza o processo social, tornando a "riqueza" um bem comum, sem desigualdades. Alongam-se mais os que partilham esse ponto de vista. Afirmam que o Amor, como fundamento social, anula o esforço individual, gerando a preguiça, a escassez, e consequentemente, a violência... Um paradoxo. Mas uma questão que pode desafiar algumas lucubrações.
O que teria acontecido ao progresso, à transformação dos meios de produção dos recursos, sem a 'virtude' da ganância? Como seria o modelo social sem a propriedade privada, que levou o homem a desenvolver formas complexas de relacionamentos políticos e econômicos com os seus semelhantes? É possível imaginar uma sociedade sem classes sociais, baseada na igualdade econômica, na propriedade comum, como descreveram as utopias?
Como tornar úteis e produtivas as diferenças de habilidades e talentos, sem torná-los o centro do progresso e, claro, do poder organizador da política e da sociedade?
O que nos diz a História desse longo percurso feito pela ganância do homem? Que marcas ficaram registradas nos anais dos que relataram sua caminhada? E o que dizer das organizações de fronteiras dos Estados Nacionais e das guerras movidas pela cobiça, pela conquista de riquezas? O que nos conta a História dos genocídios perpetrados para alcançar a utopia da paz, com a exclusão dos que não são 'iguais' a nós?
Será que o caminho da ganância foi a melhor escolha para o desenvolvimento das sociedades humanas? Como saber??
E o Amor? Imediatamente descartado como um sinal de fraqueza e impotência para dirigir os destinos do homem e de uma nação?
Compreende-se o descarte do Amor. Não é um conhecimento. O Amor não é uma arte. Não se coloca na dimensão pragmática com que organizamos a vida, a política, a sociedade.
O Amor não é uma utilidade. O Amor é reconhecimento do outro como um igual, um semelhante. O amor é um ato de inclusão.
Eis a chave perdida, ou nunca encontrada, apesar de tão decantada nos aforismos e nos cultos e pregações religiosos.
Apesar das conquistas tecnológicas (ou por causa delas), da tão apregoada 'abundância' (de quantos? Treze famílias dominam 70% das riquezas existentes; a sobra, fica para 7 bilhões partilharem numa batalha sangrenta!), a que reduzimos a nossa tão cobiçada 'felicidade'?
Interessante... Angustiamo-nos todos os dias para alcançar esse tal estado de 'satisfação'
(em que consiste ele? Em bens? Em riquezas?). O que acaba por sobrar apenas a angústia de uma perseguição pelo bem-estar.
Uma perseguição interminável e nunca alcançada, por insaciável e pela fragilidade da vida... Ficamos reféns de uma insanidade. A felicidade não é um estado, mas um processo, uma luta contínua.
O termo grego "eudaimonia" reduz a 'felicidade' simultaneamente a um estado e a um processo, traduzido a grosso modo, a um florescimento.
Uma idéia interessante: ser feliz é florescer. O eudemonismo terminaria por definir a doutrina da busca da felicidade.
Há ainda a idéia de que a busca da 'felicidade' seria a causa da infelicidade.
Aristóteles a definiu como uma atividade.
O romano Marco Aurélio a definiu como uma luta. Fico com o sentimento de que a 'felicidade' deve ser um florescimento.
As coisas florescem, espontaneamente, sem pressa, sem desespero. Florescem apenas...
Florescer é uma comunhão com a vida.
Reconhecer o outro é comunhão, eis o grande mistério, que não permite enganos e farisaísmos.
Reconhecer que o Amor ainda é um caminho não percorrido pela humanidade, seria demasiado? Reconhecer que alguns luminares não justificam a aridez do amor que assola a humanidade, seria demasiado? Reconhecer que o desamor que gera a crueldade e que arruina a humanidade, seria demasiado?
Reconhecer que os ensinamentos do Mestre Jesus e outros avatares, caíram como sementes nas ardentes areias do deserto, seria demasiado?
Reconhecer que o amor é um florescer absoluto da nossa natureza, seria demasiado?
Eis a questão...
Que esse Natal, seja o renascimento do Cristo em cada um de nós, e que possamos florescer em amor em nossas vidas, pois somente por ele encontraremos a paz.
Deus nos abençoe em tempos tão sombrios.
m.americo
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