Não entendi a comoção em torno da plástica íntima
IVAN MARTINS
A notícia provocou o barulho de sempre. As moças engajadas foram às redes sociais dizer que esse tipo de operação representa uma violência social inaceitável. Os homens que amam as mulheres declararam seu amor incondicional a qualquer forma sagrada de vagina. Em dois minutos, apareceram dezenas de médicos explicando como a operação – embora simples e rápida – exige uma recuperação cuidadosa (um mês sem sexo!) e acarreta dois riscos sérios: infecção e perda de sensibilidade vaginal, por dano ao tecido nervoso.
Confesso que, neste tipo de assunto, estou me tornando um pessimista.
As pessoas farão coisas cada vez mais malucas com seus corpos, não importa o que a gente ache ou diga. Acredito que isso exterioriza o enorme mal estar interior com elas mesmas, que precisa ganhar forma de algum jeito. Se puderem redesenhar seus corpos – da forma como não conseguem alterar seus sentimentos – farão isso cada vez mais agressivamente, sob qualquer desculpa, inclusive a de se tornar mais atraentes. Temo que no futuro vivamos num livro de ficção científica de Willian Gibson, em que os personagens têm olhos cor de rubis, vaginas artificiais nas coxas e carregam clitóris embaixo dos braços. Eu chamaria isso de inferno, mas muitos acharão que é o paraíso.
Sendo homem, tampouco faço ideia de como seja estar insatisfeito com a própria vagina, achá-la desengonçada, pelancuda, feia. Já ouvi mulheres com esse sentimento e elas me pareceram tristes. Minha primeira impressão é que o amor e o desejo dos parceiros deveriam ajudar a colocar isso de lado, mas talvez em alguns casos essas atenções faltem, ou sejam insuficientes. Deve haver situações em que a modificação do corpo seja mais que mera estupidez ou frivolidade, e talvez um psicólogo seja a pessoa adequada para ajudar a determiná-las.
Embora eu não saiba nada sobre os sentimentos da vagina, sei como os homens se sentem em relação ao pênis.
Milhões vivem profundamente insatisfeitos com a forma e, sobretudo, com as dimensões que receberam da natureza. Se houvesse a certeza de mudar essa situação com uma cirurgia de três mil reais, de curta duração e baixo risco, tenho certeza de que muito se atirariam a ela como loucos - desesperados e famintos. Quem, sendo homem, sabendo como cada um de nós se sente em relação ao próprio pênis, diria a outro homem que não fizesse por si mesmo essa graça? Mas não existe uma cirurgia segura que ofereça a prodigalidade peniana. Portanto, estamos livres para rir, julgar e invejar as mulheres.
Não quero com isso endossar de forma nenhuma as plásticas vaginais. Já disse que acho esse modismo uma expressão da nossa coletiva (e inexorável) maluquice. Mas tampouco fico confortável vendo as pessoas que fazem esse tipo de procedimentos sendo estigmatizadas. Acho patético que uma sociedade que foi tão longe em incentivar o flagelo corporal das mulheres em nome da beleza se volte coletivamente contra a mais recente manifestação da sua própria loucura – apenas outro sintoma, sutil e delicado, de que coisas muito mais importantes estão erradas.
07 de setembro de 2012
ivan martins
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