Desisti. Não deveria, por certo. Mas, num mundo onde mentira e realidade vivem lado a lado, numa indiferença constrangedora, é desestimulante manter uma conversação que valha a pena. Tudo é logo tachado de “fake”. Fim de papo. Fica o entendido pelo não entendido, e estamos dito. Metade curte, outra discute. Ofensas à partir do terceiro comentário, e o assunto já desviou para ódio de gênero ou raça ou extremistas políticos e antis. Quanto ao fato e suas versões, foram para o espaço cibernético. A verdade? Meu caro, não seja ingênuo, foi extinta desde a última geração. Terminou junto com o inexistente diálogo de pais e filhos. Emudecidos pelos smartphones, distorcidos pelas redes. Filhos não admitem erros, no máximo são mal compreendidos.
Pais temem a reação de filhos, engolem seus jeitos, trejeitos, tatoos, argolas, tribos, bebedeiras, cheiros exóticos em solitárias e gratuitas celas-quartos que habitam sem regras ou despesas.
EM OUTRO MUNDO – Vivem no mesmo lugar, em universos diferentes. Há um multiverso, 11 dimensões que separam gerações, que não se tocam. Entre nudes, sexies, emojis, e-mails, faces, instagrans, e o que mais vier, o invisível se faz presente. Pratos por lavar, contas a pagar no mundo real, para sustentar universos online e mundo virtual. Alguém tem que quitar, ou a casa sem internet cai. Infelizmente, essas contas não são em bitcoin.
Inevitavelmente, surge uma cobrança de tempos antigos: “Filho, você lembra aquele dia em que sua inconsequência e sua irresponsabilidade…?”. Quatro pedras na mão, voz irada, negativa imediata e versão distorcida são disparadas à velocidade da luz. É proibido frustrá-los ou fazê-los admitirem erros.
SÃO UM SACO – Pedir perdão então, nem se fala. Pais são um saco ! Inventam, mentem, cobram. Filhos não erram, mesmo que, para isso, distorçam o espaço, revertam o tempo, decretem que entraram num buraco de minhoca.
Sei que ando relendo “Alice no País das Maravilhas”. Cismei que estou erradamente do outro lado do espelho ou que tudo que ando vivendo é um pesadelo que não quer acabar. Vai ver estou no limbo e não tenha percebido. Ando querendo adotar coelho de óculos e relógio.
24 de julho de 2017
Eduardo Aquino
O Tempo
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