Como o âncora do telejornal anunciava,
com estrondoso orgulho, que agora o sistema de ônibus de São Paulo terá horários
e o usuário poderá saber o momento exato em que vai pegar a sua condução,
Alzeni, que trabalha conosco há 18 anos, correu a ouvir. Era uma notícia
interessante. O repórter mostrava entusiasmo fora do comum pela tecnologia de
ponta. Um sistema da internet vai possibilitar que possamos, no ponto, acessar o
site que vai mostrar onde está nosso ônibus e a que hora ele chegará.
Com um belo iPad na mão, o jovem acessava e descobria que o ônibus por ele desejado chegaria ao ponto em uma hora. Ficou meio desapontado e repetiu a operação com outra linha. Em 15 minutos um carro encostaria, só que em ponto a 30 quadras dali, para outro destino. De qualquer maneira, a notícia, dizia o jovem que deve viver conectado o tempo todo com tudo, era boa para quem anda de ônibus. Finalmente, poderemos chegar ao ponto na hora exata em que devemos embarcar.
No mesmo instante me vi nos anos curiosos em que vivi em Berlim e o meu ônibus 29 chegava ao ponto às 13h37, sem erro. Chegasse atrasado, veria o que é bom para a tosse. Claro, era Berlim, pouco trânsito, ruas pavimentadas como se fossem por blocos de mármore, lisos e limpos. A nostalgia se dissolveu na realidade paulistana.
Logo, um popular entrevistado pelo eufórico repórter respondeu com uma pergunta: "Tudo bem! E quem informa ao congestionamento que o meu ônibus tem horário para chegar àquele ponto e todos devem sair da frente?" Aliás, em jornalismo há algumas coisas inúteis, mas nenhum chefe de reportagem se dá conta. Já fiz muito isso. Para que entrevistar povo na rua? As respostas são: "Não sei. De que o senhor está falando? Anh? Ah! É? Vai ser bom, né!"
Ninguém sabe nada. Há alguns que tuitam rapidamente para se informar. Como se o twitter desse alguma informação. É tudo questão de encher linguiça, como se dizia na Pré-história. Outra categoria inútil para ser entrevistada: jogador de futebol após o jogo. Suados, cansados, esbaforidos, loucos para irem ao vestiário, nada dizem. Não têm o que dizer. A maioria também não joga, não tem cacife para jogar. Dia desses o Valdivia respondeu: "Perdemos porque entramos com sono". Gostei. O primeiro que disse uma coisa engraçada, curiosa, verdadeira.
Voltemos aos transportes. Alzeni olhou para mim e perguntou: "Então, vai ser resolvido o problema dos ônibus? Porque não entendi nada do que falaram aí". Nem eu, acrescentei. Pergunto: serão distribuídos computadores, iPhone, iPads e outros acessórios para toda a população acessar os horários? Depois virão os cursos para se saber manejar tudo? Depois, dirão aos concessionários das linhas para colocarem carros em número suficiente para atender às demandas? Depois virão os aumentos de tarifas?
Sábia, Alzeni arrematou, como se diz no interior: "Quando ônibus chegar no horário, quando eu entender de computador, quando político se preocupar com o povo, estarei velhinha, aposentada e sentada em casa na frente da televisão, não virei trabalhar, vou olhar netos e bisnetos. Ônibus no horário e transporte decente para pobre só na cabeça de quem vive enganando trouxa".
Sábia Alzeni que me conta que o ônibus, que a traz de manhã, para no ponto quando quer. Ou quando não está superlotado. O ônibus passa quando lhe dá na telha. Ela entra e jamais se sentou nestes 18 anos em que trabalha conosco. Vem sempre em pé, socada. Amassada, empurrada, recebendo cotoveladas, empurrões, safanões, puxões, repelões, palmadas, pancadas, piparotes, colisões. Como Cristo atravessando a Via-Sacra (Afinal, hoje é Sexta-Feira Santa).
Ela é jogada dentro do veículo por braços que a forçam a subir. Ela está num lugar e vai sendo levada para outro, até se ver amassada, com falta de ar, sufocada. Por que nossos "modernos" ônibus têm janelas que um abre, o outro fecha, um terceiro reclama, o quarto xinga do golpe de vento, o último diz que vai morrer sem poder respirar? Ar condicionado? Para pobre? Pobre fica gripado com ele.
Pisam nos pés, cutucam, dão beliscões, essas viagens são assim, mas quem comanda os transportes não sabe. Nunca um prefeito, vereador, secretário de transportes, seja quem for esperou num ponto, viajou num ônibus. Nem me falem em horários de pico, todos os horários são de pico. O transporte é uma calamidade, assim é que se trata o usuário, os que trabalham e chegam exaustos, exangues, moídos, prostrados, arfantes, extenuados, esgotados, esbaforidos. Sucumbidos. Pedir produção a essa gente? Prometer horários? Olhem aqui se tem guaraná nos meus olhos! (Só quem é caipira vai entender esta).
Com um belo iPad na mão, o jovem acessava e descobria que o ônibus por ele desejado chegaria ao ponto em uma hora. Ficou meio desapontado e repetiu a operação com outra linha. Em 15 minutos um carro encostaria, só que em ponto a 30 quadras dali, para outro destino. De qualquer maneira, a notícia, dizia o jovem que deve viver conectado o tempo todo com tudo, era boa para quem anda de ônibus. Finalmente, poderemos chegar ao ponto na hora exata em que devemos embarcar.
No mesmo instante me vi nos anos curiosos em que vivi em Berlim e o meu ônibus 29 chegava ao ponto às 13h37, sem erro. Chegasse atrasado, veria o que é bom para a tosse. Claro, era Berlim, pouco trânsito, ruas pavimentadas como se fossem por blocos de mármore, lisos e limpos. A nostalgia se dissolveu na realidade paulistana.
Logo, um popular entrevistado pelo eufórico repórter respondeu com uma pergunta: "Tudo bem! E quem informa ao congestionamento que o meu ônibus tem horário para chegar àquele ponto e todos devem sair da frente?" Aliás, em jornalismo há algumas coisas inúteis, mas nenhum chefe de reportagem se dá conta. Já fiz muito isso. Para que entrevistar povo na rua? As respostas são: "Não sei. De que o senhor está falando? Anh? Ah! É? Vai ser bom, né!"
Ninguém sabe nada. Há alguns que tuitam rapidamente para se informar. Como se o twitter desse alguma informação. É tudo questão de encher linguiça, como se dizia na Pré-história. Outra categoria inútil para ser entrevistada: jogador de futebol após o jogo. Suados, cansados, esbaforidos, loucos para irem ao vestiário, nada dizem. Não têm o que dizer. A maioria também não joga, não tem cacife para jogar. Dia desses o Valdivia respondeu: "Perdemos porque entramos com sono". Gostei. O primeiro que disse uma coisa engraçada, curiosa, verdadeira.
Voltemos aos transportes. Alzeni olhou para mim e perguntou: "Então, vai ser resolvido o problema dos ônibus? Porque não entendi nada do que falaram aí". Nem eu, acrescentei. Pergunto: serão distribuídos computadores, iPhone, iPads e outros acessórios para toda a população acessar os horários? Depois virão os cursos para se saber manejar tudo? Depois, dirão aos concessionários das linhas para colocarem carros em número suficiente para atender às demandas? Depois virão os aumentos de tarifas?
Sábia, Alzeni arrematou, como se diz no interior: "Quando ônibus chegar no horário, quando eu entender de computador, quando político se preocupar com o povo, estarei velhinha, aposentada e sentada em casa na frente da televisão, não virei trabalhar, vou olhar netos e bisnetos. Ônibus no horário e transporte decente para pobre só na cabeça de quem vive enganando trouxa".
Sábia Alzeni que me conta que o ônibus, que a traz de manhã, para no ponto quando quer. Ou quando não está superlotado. O ônibus passa quando lhe dá na telha. Ela entra e jamais se sentou nestes 18 anos em que trabalha conosco. Vem sempre em pé, socada. Amassada, empurrada, recebendo cotoveladas, empurrões, safanões, puxões, repelões, palmadas, pancadas, piparotes, colisões. Como Cristo atravessando a Via-Sacra (Afinal, hoje é Sexta-Feira Santa).
Ela é jogada dentro do veículo por braços que a forçam a subir. Ela está num lugar e vai sendo levada para outro, até se ver amassada, com falta de ar, sufocada. Por que nossos "modernos" ônibus têm janelas que um abre, o outro fecha, um terceiro reclama, o quarto xinga do golpe de vento, o último diz que vai morrer sem poder respirar? Ar condicionado? Para pobre? Pobre fica gripado com ele.
Pisam nos pés, cutucam, dão beliscões, essas viagens são assim, mas quem comanda os transportes não sabe. Nunca um prefeito, vereador, secretário de transportes, seja quem for esperou num ponto, viajou num ônibus. Nem me falem em horários de pico, todos os horários são de pico. O transporte é uma calamidade, assim é que se trata o usuário, os que trabalham e chegam exaustos, exangues, moídos, prostrados, arfantes, extenuados, esgotados, esbaforidos. Sucumbidos. Pedir produção a essa gente? Prometer horários? Olhem aqui se tem guaraná nos meus olhos! (Só quem é caipira vai entender esta).
06 de abril de 2012
Ignácio de Loyola Brandão
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