sábado, 17 de setembro de 2011

PUC, ANTRO DE MACONHA, PROÍBE FESTIVAL DE CULTURA CANÁBICA

As drogas, como o rock, nos chegaram via Estados Unidos. Não que fossem produzidas lá, mas o consumo da juventude norte-americana exportava a moda para os símios ao sul do Trópico de Câncer. Uma edição da revista O Cruzeiro publicou, nos anos 50, uma reportagem significativa sobre a "erva do diabo", como era então chamada a Cannabis sativa. Para aproximar-se da droga, que circulava então nas favelas e no presídio, um repórter deixou crescer a barba, como camuflagem junto aos traficantes e consumidores. Maconha era então coisa de submundo, e barba logotipo de marginal. Mas tarde, virou logotipo de corrupto petista, mas isto já é outra história.

Bastou os universitários norte-americanos adotarem a marijuana - voz mexicana que indicava a origem do produto - a erva virou moda no Brasil, particularmente nos campi. Como jamais suportei modas, e particularmente as vindas do Norte, meu repúdio à maconha era antes de tudo teórico, político. Por outro lado, o consumo da maconha era vício gregário, e sempre me afastei de cerimoniais coletivos. Os curtidores da cannabis eram em geral pessoas de pouca ou nenhuma leitura, e nada me impelia a confraternizar com eles.

Verdade que havia gente consumindo alfafa por maconha sem se dar conta. Afinal, pouca é a diferença entre Cannabis sativa e Medicago sativa. Em meus dias de Porto Alegre, quando escrevia na finada Folha da Manhã, caiu-me em mãos a notícia de um traficante que operava numa favela chamada Vila do Cai n’Água. Preso pela polícia, alegou que nada estava vendendo de ilegal. Vendia alfafa batizada com esterco de cavalo. E o pessoal não reclama? – perguntou o policial. “Eles acham que o cheiro é muito forte. Digo que é maconha do Nordeste, da boa”.

Os grandes difusores da maconha e outras drogas foram os roqueiros e a universidade. Não se concebe show de rock ou rave sem drogas. Muito menos universidade. Consumida anteriormente por marginais, a maconha foi elevada à dignidade universitária. Com esta bendita mania que temos de importar do Primeiro Mundo o que de pior o Primeiro Mundo produz, logo foi adotada pela universidade brasileira.

O leitor deverá ter conhecido ou ouvido falar de pequenas comunidades do interior do país, onde a droga inexistia. Basta criar um curso ou extensão universitária nalguma dessas comunidades, e no dia seguinte a droga e o tráfico lá se instalam. Em meus dias de Dom Pedrito, maconha era fenômeno distante, que só ocorria nas metrópoles do centro. Bastou um campus na cidade e a droga passou a ser vendida em plena Barão de Upacaraí.

Quando a maconha era proibida no Brasil – início dos anos 90 – os campi eram os locais mais seguros para quem queria drogar-se sem ser perturbado pela polícia. Um dos mais reputados fumódromos de São Paulo era o campus da PUC. Desde há muito se sabe que os campi abrigam aprazíveis fumódromos, protegidos pela asa cúmplice dos reitores.

Mas ai de quem disser que o rei está nu. Foi o que aconteceu com o psiquiatra Içami Tiba. Ao analisar o caso de Suzane von Richthofen, estudante de direito da PUC de São Paulo que matou os pais em 2002, afirmou: 'A PUC é um antro de maconha'. Que a maconha tinha livre curso na PUC, isto era público e sabido, e nenhum universitário negará este fato. A PUC, melindrada, entrou com dois processos contra o psiquiatra: um de indenização por danos morais e uma queixa-crime por difamação. O crime foi dizer em público, com todas as letras, o que era público mas jamais admitido.

Foram precisos seis anos para que um reitor admitisse publicamente, em 2009, o uso de drogas no campus de Perdizes. O reitor Dirceu de Mello decidiu defender o “franco enfrentamento do problema” e coibir o consumo nas dependências universitárias. “A PUC não quer ser marcada como um território livre para o uso de drogas. O que é ilegal não pode e pronto. Aqui não é lugar para ficar fumando maconha” – disse na época o pró-reitor de Cultura e Relações Comunitárias, Hélio Roberto Deliberador.

120 seguranças da Graber, uma prestadora de serviço, receberam treinamento para abordar quem for visto consumindo drogas na unidade. Mas a abordagem seria leve. Nada de encaminhar à justiça que fosse flagrado cometendo um ilícito. Em média, dez usuários por dia seriam abordados. E por que apenas dez usuários? Deliberador não explica. É de supor-se que para não espalhar a inquietação entre estes bravos jovens – o futuro da nação – que finalmente encontraram um eruv tranqüilo onde transgredir a lei sem temer as conseqüências da transgressão à lei.

Se o leitor imagina que o transgressor seria encaminhado às autoridades para a devida punição, em muito se engana o leitor. Os funcionários da Graber teriam de pedir gentilmente que o cigarro fosse apagado, e alertariam que o uso é ilegal e que a universidade não é o espaço adequado para o consumo. Pelo que me consta, nenhum aluno foi punido e a erva continuou correndo solta na PUC.

Assim sendo, me surpreende notícia que li nos jornais de ontem. O mesmo reitor Dirceu Mello, cuja orientação aos seguranças da Graber era a de pedir gentilmente aos acadêmicos maconheiros que o baseado fosse apagado, decidiu suspender ontem as atividades administrativas e acadêmicas no campus Monte Alegre. A medida foi tomada pelo reitor após estudantes divulgarem a realização do 1º Festival de Cultura Canábica. O festival, que teria a participação de bandas adeptas da legalização do uso da maconha, deveria atrair, segundo a reitoria, de 4000 a 6000 pessoas.

Escândalo nas hostes universitárias. "Não somos baderneiros. Só queremos discutir a legalização da maconha. Afinal, não existiria produção cultural e acadêmica nesse País se não existisse a maconha", gritava ontem, em um microfone improvisado, Marcel Segal, de 23 anos, aluno do curso de Comunicação e Multimeios da PUC-SP.

Essa agora! A produção cultural e acadêmica do País depende da cannabis. Confesso que não me havia dado conta deste fundamental instrumento de ensino e conhecimento. Mas vai ver que é assim mesmo, já que não há universidade no Brasil onde não se consuma maconha. Quanto ao reitor Dirceu Mello, este senhor insensível às necessidades culturais da comunidade que administra, sua política é a mesma das ditas Unidades de Polícia Pacificadora nas favelas do Rio: tráfico e consumo, tudo bem.

Desde que discretos. Festival de Cultura Canábica é dar muita bandeira. Fume à vontade. Mas não espalhe.

janer cristaldo

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