domingo, 15 de junho de 2014

POR QUE XINGAM?

Grosseiros, violentos, desrespeitosos com a pessoa e com o cargo, os xingamentos à presidente Dilma Rousseff na abertura da Copa do Mundo, no Itaquerão, provocaram perplexidade até naqueles que apostavam em vaias. Mas, além de condenar o ato, cabe pelo menos tentar desvendar como tal agressividade ganhou eco entre os mesmos torcedores que arrepiaram o País com o canto a capela do Hino Nacional. E que esbanjaram cordialidade ao aplaudir o time adversário.

Seria possível atribuir a condenável elevação do tom à insatisfação – real e palpável – com o governo, com serviços públicos de péssima qualidade, preços altos, corrupção. Talvez. Mas isso já está expresso nas manifestações de rua, em vaias e mais vaias. Por que ultrapassar os limites?
O ex Lula diz – e com alguma dose de razão – que a falta de educação, não na escola, mas em casa, explicaria os insultos. “Não é dinheiro, nem escola, nem título de doutor que dá educação para a pessoa. Educação se aprende em casa”, reagiu Lula, aproveitando-se, mais uma vez, para apontar a elite endinheirada como responsável pela expressão de baixo calão.

Registre-se que Lula não é propriamente alguém que pode dar exemplos nessa seara, ele próprio boquirroto e, não raro,deseducado. Lembram-se do jovem que reivindicou espaço para praticar tênis quando Lula fazia campanha ao lado do governador Sérgio Cabral (PMDB-RJ)? “Tênis é esporte da burguesia, porra!”. Depois, sugeriu que o adolescente praticasse natação. Ao saber que a piscina estava fechada, cobrou deCabral: “Se a imprensa vem aí no fim de semana e vê essa porra fechada, o prejuízo político vai ser infinitamente maior que colocar dois guardas aí”.


Um comportamento modelar para estimular a cultura ao desrespeito.
Cultura que se cristaliza quando não se cumpre o que a Lei manda, quando há conivência com a corrupção, quando a mentira ganha cores de verdade por excesso de repetição, quando a eleição fala mais alto do que o atendimento às demandas do cidadão.

Em um post no Facebook, Márcia Velloso foi certeira: “Quando os que comandam perdem a vergonha, os que obedecem perdem o respeito”. A frase do filósofo alemão Georg Lichtenberg (1742-1799) cabe como luva para o que se vê hoje.

Dilma saiu-se bem nas declarações que fez no dia seguinte aos xingamentos. Mas dificilmente conseguirá estancar vaias e até ofensas por onde passar.

Parte da reação ensandecida contra ela advém de algo que a beneficiou até pouco tempo: a cultura ao ódio, cultivada pelo “nós x eles”, tradução petista do bem versus o mal. Sem meio termo, incentivou-se o radicalismo. De ambos os lados. E leite derramado não volta ao vasilhame.

15 de junho de 2014
Mary Zaidan é jornalista.

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