sábado, 21 de junho de 2014

PRAZER DE ENVELHECER E DE MORRER




 
A cada dia, manchas senis vão decorando o dorso de minha mão, como estrelas que vão surgindo no início da noite. O sorriso sendo emolduradas por bem desenhadas rugas, alegres e expressivas. Um vinco insiste em descer a cada lado do nariz em direção aos lábios.
A pele vai lentamente se descolando dos músculos como se divorciasse de sua elasticidade.
O sono piora e mais pareço um vaqueiro que às 4h já não cabe na cama.

E dia a dia, mês a mês, vou desenvolvendo a natureza, aquilo que não é meu: células, proteínas, carbonos, nitrogênios, enfim, a matéria!

Lenta e continuamente me despeço da juventude, do vigor, das ilusões e sonhos impossíveis. Não há mais lugar para arroubos, impulsividades, revoltas juvenis. Pouco a pouco sou dominado pela moderação, pela compreensão profunda do que vai na minha mente, coração e alma.
Observo o mundo que me cerca, munido de curiosidade, sabedoria. Pouca coisa me surpreende, quase nada me incomoda, uma serenidade me acalma mesmo diante dos absurdos que abalam o mundo.

PERMITIR O DESCANSO

Procuro entender a tecnologia como instrumento e facilitação do cotidiano, mas sem deslumbramento ou dependência. Continuo anotando em papéis e arquivando, algo que não pega “vírus” nem é alvo de “hackers”. Continuo sonhando, construindo sonhos e já consigo morar dentro de alguns deles. Ainda batalho, luto, mas me permito o descanso.

A energia da fé e a energia mental continuam firmemente aumentando, na mesma proporção que minha vitalidade e físico vão decrescendo em direção ao fim. Continuarei todos os dias buscando evoluir até o dia que deixar a vida: um acidente fatal, um infarto fulminante, um câncer devastador – nada me aterroriza. Espero a morte, assim como um passageiro aguarda um trem ou um avião. Um dia chegamos, num outro partimos. Morrer é tão natural quanto nascer…

“Nu viestes a esta vida, tão nu quanto viestes sairás dela, e pelo teu trabalho nada que fizestes louvarás em tuas mãos. Isto é vaidade e vento que sopra…”, como nos ensina Eclesiastes.
A vida é meramente um estágio onde, presos em quatro dimensões, a consciência mora num corpo material fadado a ser extinto, após inúteis vaidades, raivas, ódios, ciúmes, ressentimentos, invejas, apegos, medos, angústias e, em menor proporção, a alegria, o amor, o carinho, a fé, a confiança, a lealdade e a humildade.

SERENAMENTE…

Morrerei, espero, serenamente! Afinal, nada nem ninguém me prende à vida material.
Amo, sou amado, sei que poucos têm antipatia, raiva, ódios de mim, mas a recíproca não é verdadeira: o perdão mora em meu coração!

Peço perdão aos que possa ter ofendido. Não sou candidato a nada, nunca fui, nunca serei. Apenas busco com minhas palestras, livros, no exercício da medicina, ser um instrumento de inteligência divina e superiores. Busco crer e saber! Alio minha fé ao estudo científico.

Creio que há eternidade e reencontro de almas (ou “consciências não materiais”, se quiserem) daqueles que se amaram na vida terrena. E sei que há “inferno” para os que se viciaram, corromperam, traficaram, assassinaram, se apegaram a uma ilusão absoluta que é a vida terrestre e material.
No mais, cada um busque um sentido de viver, envelhecer, morrer, ser eterno!!!

21 de junho de 2014
Eduardo Aquino

A GRANDE TRANSFORMAÇÃO E A CORRUPÇÃO DE NOSSO TEMPO

 

01
Normalmente, as sociedades se assentam sobre o seguinte tripé: economia (que garante a base material da vida humana), política (pela qual se distribui o poder e se montam as instituições que fazem funcionar a convivência social) e ética (que estabelece valores e normas que regem os comportamentos humanos). Geralmente, a ética vem acompanhada por uma aura espiritual que responde pelo sentido último da vida e do universo, exigências sempre presentes na agenda humana.

Essas instâncias se entrelaçam numa sociedade funcional, mas sempre nessa ordem: a economia obedece à política e a política se submete à ética. Mas, a partir da Revolução Industrial no século XIX, a economia começou a se descolar da política e a soterrar a ética. Surgiu uma economia de mercado, de forma que todo o sistema econômico fosse dirigido e controlado apenas pelo mercado, livre de qualquer controle ou de um limite ético.

A marca registrada desse mercado não é a cooperação, mas a competição, que vai além da economia e impregna todas as relações humanas. Mais ainda: criou-se, no dizer de Karl Polanyi, “um novo credo, totalmente materialista, que acreditava que todos os problemas poderiam ser resolvidos por uma quantidade ilimitada de bens materiais”(“A Grande Transformação”, Campus, 2000, pág. 58). Esse credo é, ainda hoje, assumido com fervor religioso pela maioria dos economistas do sistema imperante e, em geral, pelas políticas públicas.

EIXO ÚNICO

A partir de agora, a economia funcionará como o único eixo articulador de todas as instâncias sociais. Tudo passará pela economia, concretamente, pelo PIB. Quem estudou em detalhe esse processo foi o filósofo e historiador da economia, já referido, Karl Polanyi. Demonstrou ele que, “em vez de a economia estar embutida nas relações sociais, são as relações sociais que estão embutidas no sistema econômico” (pág. 77). Então, ocorreu o que ele chamou de “a grande transformação”: de uma economia de mercado se passou a uma sociedade de mercado.

Em consequência, nasceu um novo sistema social, no qual a sociedade não existe, apenas os indivíduos competindo entre si. Tudo mudou, pois tudo vira mercadoria. Qualquer bem será levado ao mercado para ser negociado em vista do lucro individual. Polanyi não deixa de anotar que tudo isso é “contrário às substâncias humana e natural das sociedades”. Mas foi o que triunfou, especialmente no pós-guerra.

Aqui, cabe recordar as palavras proféticas de Karl Marx: “Chegou, enfim, um tempo em que tudo o que os homens haviam considerado inalienável se tornou objeto de troca, de tráfico, e podia vender-se. (…)
O tempo da corrupção geral, da venalidade universal, ou, para falar em termos de economia política, o tempo em que qualquer coisa, moral ou física, uma vez tornada valor venal, é levada ao mercado para receber um preço, no seu mais justo valor”.

EFEITOS DESASTROSOS

Os efeitos socioambientais desastrosos dessa mercantilização de tudo estão sendo sentidos hoje pelo caos ecológico da Terra. Temos que repensar o lugar da economia no conjunto da vida humana, especialmente face aos limites da Terra.

Quando uma sociedade se entorpece como a nossa, e por seu crasso materialismo se faz incapaz de sentir o outro como outro, e somente o vê enquanto eventual produtor e consumidor, ela está cavando seu próprio abismo.

Agora, cabe o retorno ao “não há alternativa”: ou mudamos, ou pereceremos, porque os nossos bens materiais não nos salvarão. É o preço letal por termos entregue nosso destino à ditadura da economia transformada num “deus salvador” de todos os problemas.

21 de junho de 2014
Leonardo Boff

DIA DISSO E DAQUILO, MENOS DIA DAS MÃES E DIA DOS PAIS

 


 
Dia, hora, minutos, semanas, meses são apenas medidas de tempo. Nós é que criamos datas especiais e estabelecemos dias e meses determinados para comemorá-las. Poucas dessas datas fazem sentido, e a maioria foi inventada pelo comércio. O homem moderno é um consumista nato.

Dia 12 passado foi o Dia dos Namorados e o Congresso Nacional acaba de criar o Dia do Palhaço, comemorado sempre em 10 de novembro. De todas essas datas, guardo mesmo é o Dia das Mães. E por que não o Dia dos Pais? Porque a maternidade é provada, e a paternidade é presumida. E também porque o filósofo do cotidiano concluiu que mãe é mãe e pai é pai. Sim, mas existe o Dia dos Pais. É verdade, mas acho um excesso.

Tanto é assim que a data não existe oficialmente, como o Dia das Mães, que o presidente Getúlio Vargas criou por meio do Decreto nº 21.366, publicado no “Diário Oficial da União” em 9.5.1932 e cujo Artigo 1º reza: “O segundo domingo de maio é consagrado às mães, em comemoração aos sentimentos e virtudes que o amor materno concorre para despertar e desenvolver no coração humano, contribuindo para seu aperfeiçoamento no sentido da bondade e solidariedade humana”.

FORA DO CALENDÁRIO

Esse decreto está em vigor há mais de 80 anos. Pois bem: em artigo publicado no blog Tribuna da Internet, do jornalista Carlos Newton, do qual sou assíduo leitor, o jurista Jorge Béja noticia que a Secretaria de Educação de São Paulo suprimiu a data do calendário escolar, descumprindo o decreto em vigor.

O Dia das Mães é comemorado em quase todo o mundo, por legislação própria, como aqui, ou em razão do costume, que é uma das principais fontes do direito. No Brasil, a Lei de Introdução ao Código Civil (que a partir de 2010 passou a ser denominada Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro) dá ao Judiciário o poder de decidir, com base nos usos e costumes e na tradição, quando a lei é omissa ou inexistente.

Pois não é que a Prefeitura de São Paulo, do PT, revogou a lei e acabou com a data? O mesmo procedimento teve a Prefeitura de Brusque, em Santa Catarina, que proibiu a comemoração da data pelas escolas municipais por imposição da militância gay, que alega que festejar o Dia das Mães constrange crianças adotadas por gays.

Nesse tempo de Copa das Copas, quem pensa que já viu tudo está muito enganado. Sou um atrasado: sempre pensei que o casamento fosse a instituição própria para a procriação. E não é: passou a ser um contrato de vivência a dois. Nesse caso, não seria melhor registrar esses contratos na Junta Comercial em vez de num cartório civil?

Juca Saco, filósofo do cotidiano, não conseguia entender por que não podia viver pelado. Eu expliquei: não pode porque é falta de pudor. Que qué isso, sô? Cê tem mania de falá difice. Ô, Sylo, se a gente nasce pelado, devia de pudê ficá assim, né? Só os índio é que pode? Os pulítico… O que tem os políticos, Juca? Nada… eu ia falá umas coisa, mas é bestagem…

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NOTA DA REDAÇÃO DO BLOGPara a Tribuna da Internet, é uma honra ter um intelectual como Sylo Costa repercutindo nossa campanha, iniciada por Francisco Bendl e apoiada por Jorge Béja. Sylo Costa é um grande intelectual, foi deputado quatro vezes e está fazendo muita falta na política. (C.N.)

21 de junho de 2014
Sylo Costa
O Tempo