sexta-feira, 12 de junho de 2015

SETE CELEBRIDADES QUE MUDARAM DE GÊNERO - OU DE SEXO


Para além de Caitlyn Jenner, outros famosos deram o que falar quando assumiram nova identidade



113Bruce Jenner como Caitlyn, em cena da série-documentário 'I Am Cait', do canal E! (Foto: VEJA.com/Reprodução)





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Bruce, ou melhor, Caitlyn Jenner, não foi a primeira celebridade a chocar o mundo ao sair do armário com roupas e identididade diferentes das que costumava usar. A ex-atleta olímpica, mais conhecida por ser o padrasto da socialite Kim Kardashian, se tornou o centro das atenções da imprensa de fofocas americana ao anunciar que, na verdade, era mulher. Pouco tempo depois, assumiu completamente o novo gênero e estampou a capa da revista americana Vanity Fair com sua nova identidade. "Me chamem de Caitlyn", pedia na capa.

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Para além de Bruce/Caitlyn, outras celebridades deram o que falar quando anunciaram suas novas identidades sexuais. No Brasil, foi o cartunista Laerte quem pôs a questão em pauta. Mas há outros casos, como o da modelo Lea T e o da atriz Thammy Miranda, filha de Gretchen, que recentemente anunciou que pretende ser "um homem diferente". Confira abaixo a lista de celebridades que desafiaram o padrão de gênero:

As celebridades que desafiaram o conceito de gênero


1 de 7(Foto: Reprodução/Reuters)

Caitlyn Jenner

O ex-atleta olímpico Bruce Jenner, mais conhecido como o padrasto da socialite Kim Kardashian, virou notícia depois de declarar que se via como mulher e que pretendia mudar de gênero e de sexo. A partir daí, passou a ser o centro das atenções no reality show Keeping up with the Kardashians, bateu recorde de audiência na TV com uma entrevista exclusiva ao canal ABC e posou de vestido para a capa da revista americana Vanity Fair, em que pede: “Me chamem de Caitlyn”. À revista, Jenner afirma diz ansiar para que o público conheça o seu lado mais feminino. Por enquanto, Caitlyn, que ganhou uma seguidíssima conta no Twitter, não fez a cirurgia de mudança de sexo, mas ela está em seus planos.

2 de 7(Foto: João Cotta/TV Globo/VEJA)

Thammy Miranda

Thammy Miranda, que chegou a iniciar uma carreira seguindo os passos da mãe, a reboladeira Gretchen, assumiu-se transexual em 2014. A filha da “Rainha do Bumbum” passou a infância no Nordeste e ficou conhecida quando se lançou como funkeira em 2000. Não demorou para que posasse para capas de revistas masculinas. Dez anos mais tarde, contudo, ela se assumiu homossexual e iniciou o processo de transição de gênero com cirurgias para a retirada do útero, ovários e seios, mas a genitália continua a original.

3 de 7(Foto: Marco Pinto/VEJA)

Laerte

Depois de se consagrar com seus desenhos, Laerte Coutinho se tornou uma figura de proa da população transgênera, pela qual vem militando em tirinhas e entrevistas. Laerte afirma ter se descoberto transgênero depois do telefonema de um fã, que apontou em uma tirinha, na qual o personagem Hugo se vestia de mulher, um desejo enrustido da cartunista. O anúncio público foi feito em 2010, quando Laerte se assimiu cross-dresser -- pessoa que gosta de vestir como alguém do sexo oposto. Daí em diante, o cartunista -- ou a cartunista, como prefere -- vem se tornando cada vez mais feminina, com enchimento nos seios e cabelos loiros. Uma cirurgia para mudança de sexo, no entanto, não estaria no horizonte.


4 de 7(Foto: Reprodução/VEJA)

Lana Wachowski

Desde o lançamento de Matrix, o diretor Larry Wachowski era pauta de comentários sobre a sua orientação sexual. Em 2012, o cineasta veio a público confirmar os boatos que diziam que mudaria de gênero. Em um evento da indústria cinematográfica, Wachowski se apresentou a todos como Lana.
5 de 7(Foto: AgNews/VEJA)

Lea T

Lea T é o nome artístico de Leandra Medeiros Cerezo, a modelo filha do ex-jogador de futebol Toninho Cerezo. Leandra, na realidade, nasceu Leandro em 1981, na cidade de Belo Horizonte. A modelo transexual brasileira tornou-se famosa na Europa após participar de campanhas para grifes como a Givenchy, em 2010. O estilista e companheiro Riccardo Tisci foi o responsável por introduzir Lea no mundo das passarelas. Em março de 2012, Lea foi submetida à cirugia de mudança de sexo, mas, mesmo após o procedimento, ainda diz sofrer com o preconceito.
6 de 7(Foto: Divulgação/VEJA)

Laverne Cox

A atriz transgênero não revela seu nome de batismo, mas não esconde de ninguém que sofreu abusos e violência na infância por ser um garoto que não se enquadrava nos padrões masculinos, que tinha trejeitos femininos e que amava o balé. A sua franqueza fez dela, em 2015, uma das pessoas mais influentes segundo pesquisa da revista americana Times, que considera Laverne Cox um exemplo para quem luta por reconhecimento e igualdade. A atriz ganhou espaço na televisão americana em 2010, com a série TRANSform Me, que produziu e apresentou no canal VH1. Mas foi em 2013 que ela de fato caiu nas graças do público, graças à série original da Netflix Orange Is The New Black, em que interpreta a presidiária Sophia Burset. O trabalho lhe rendeu uma indicação ao Emmy.
7 de 7(Foto: Reprodução/VEJA)

Ariadna

A participação de Ariadna do Big Brother Brasil em 2011 foi controversa, pois ela não revelou que era transexual. Seu nome de batismo era Thiago Arantes, mas em 2008 Thiago fez a cirurgia de mudança de sexo na Tailândia, país conhecido por ter uma burocracia que facilita o procedimento. Após sua participação no BBB, Ariadna passou por outras mudanças que ajustaram a sua estética corporal à nova identidade sexual. Atualmente, está casada com um Italiano.

O clã Kardashian




1 de 9(Foto: VEJA.com/Reprodução)

Bruce Jenner - Caitlyn Jenner, padrasto

O ex-atleta olímpico de declato tornou-se popular por ser o padrasto das socialites Kardashians, relação contraída pelo casamento de 22 anos com a mãe de Kim e suas irmãs, Kris Jenner, de quem se separou em 2013. Eles tiveram duas filhas, Kendall e Kyllie. Este ano, Bruce voltou aos holofotes ao declarar-se mulher. Pouco tempo depois, passou a se vestir como uma e agora pede para ser chamado -- ou chamada -- de Caitlyn.

12 de junho de 2015
Veja





UMA FLOR NO LAMAÇAL


Estudantes na Coreia - Mesmo um sistema azeitado pode estar 
deixando alguma coisa de lado e negligenciando crianças que 
não aprendem(Adam Dean/VEJA)

A realidade é complexa. Pense no simples ato de ler esta página e na quantidade de áreas e saberes que foram necessários para possibilitar o nosso diálogo. Ele depende de muitos anos da minha formação; do computador em que escrevo e suas centenas de patentes; de toda a tecnologia de plantio e colheita de árvores, do processamento dessas árvores até que se tornem celulose e depois papel; do conhecimento de editores, diagramadores, revisores, fotógrafos mais a equipe que opera o maquinário da gráfica. 
Ainda há a equipe de logística, de transporte, financeira etc. Tudo isso está embutido no seu simples ato de folhear esta página (para quem a lê on-line, a quantidade de inovações e saberes envolvidos provavelmente é ainda maior).

A escola precisa preparar as pessoas para navegarem a complexidade desse mundo. Que está cada vez mais complicado, mas que já era complexo e multifacetado desde que o mundo é mundo. Seria muito difícil abarcar toda essa complexidade e interdependências em um currículo escolar. 
O professor teria de dominar todas essas áreas, o que é virtualmente impossível, e também controlar o ambiente para que as crianças só fossem expostas ao nível de complicação que pudessem deglutir. 
O que o sistema escolar fez, então, foi replicar o reducionismo da ciência: fracionar a complexidade em seus múltiplos elementos e ensiná-­los de forma separada. Ao fazê-lo, garantiu que os pupilos pudessem ter mestres que dominam profundamente o assunto ensinado e que o nível de dificuldade da matéria fosse controlado e ajustado à capacidade de compreensão dos alunos. É um modelo brilhante, que vem produzindo grandes resultados há milênios.

Como em toda atividade de especialização e divisão do trabalho, porém, há um downside: perde-se a visão global. Alguém já disse que um especialista é aquele que sabe cada vez mais sobre cada vez menos. O professor de história precisa mergulhar não apenas nessa disciplina, mas também, provavelmente, nos conteúdos de história das séries em que leciona. A mesma coisa acontece com seus colegas de todas as outras disciplinas. Esse foco no conhecimento gerou grandes avanços, mas acarretou um importante retrocesso: tudo o que está fora do currículo é ignorado, parece desimportante.

Desde a década de 90, pelo menos, com o trabalho do psicólogo Daniel Goleman, tornou-se amplamente difundido o achado de que os fatores não cognitivos são tão ou mais importantes para o sucesso na vida adulta - não apenas profissional, mas também pessoal - que o QI ou a cultura geral. A popularização dessa ideia, chamada de inteligência emocional, também penetrou a área da educação, especialmente em países desenvolvidos, onde muitas escolas criaram programas para ensinar os pequenos a ser pacientes, perseverantes, abertos, respeitosos etc. O movimento é compreensível. Se algo é muito importante na idade adulta, faz mais sentido ensiná-lo ainda na infância, pois depois pode ser difícil ou tarde demais. E também é lógico que a dianteira tenha sido tomada por países desenvolvidos. 

Primeiro, porque eles já resolveram o bê-á-bá, de forma que têm liberdade para se preocupar com problemas mais avançados. 
Segundo, porque nosso mundo é regido por uma competição de talentos - e, se houver uma dimensão do talento humano que está sendo cultivada em um lugar mas não em outro, quem ficar para trás terá uma desvantagem estratégica importante. 
E, terceiro, porque até nos países em que o sistema funciona muito bem há crianças que não aprendem, que abandonam a escola e se rendem ao crime ou às drogas. Um sinal de que mesmo um sistema azeitado pode estar deixando alguma coisa de lado.

Nos últimos anos, começou a emergir uma literatura coesa e robusta, da qual o livro Uma Questão de Caráter (péssima tradução de How Children Succeed), de Paul Tough, oferece um competente resumo, da importância de qualidades não cognitivas como garra e autocontrole para o sucesso de crianças (já mencionei aqui, em outro artigo, o experimento clássico de Walter Mischel com os marshmallows; para quem não conhece, vale a pena dar um Google ou ver twitter.com/gioschpe).

Recentemente, uma ONG deu um passo além: entendeu que a promessa desse novo olhar sobre o desenvolvimento humano não era apenas de incorporar os temas não acadêmicos à educação, mas, de forma mais ambiciosa, trazer todos os conhecimentos da ciência para a sala de aula. Sim, pois paradoxalmente a instituição que forma os futuros cientistas não tem se beneficiado de quase nada do que eles vêm descobrindo ao longo das últimas décadas. 
Desde a década de 60 do século passado, economistas já buscam quantificar o processo educacional. Mais recentemente tivemos neurocientistas descobrindo muito sobre como o cérebro aprende e psicólogos notando os impactos de questões de higidez mental sobre a capacidade de aprendizado de crianças e jovens. 
Mas nada disso entra no radar da esmagadora maioria dos professores do mundo todo, que não costumam aprender sobre esses conhecimentos em suas formações. Passam a vida tentando mudar a cabeça de seus alunos mas não têm a menor ideia de como o cérebro funciona. Baseiam sua prática em pensadores teóricos do século XIX. E eis o mais surpreendente: essa ONG não é da Finlândia, da Coreia nem de qualquer outra potência educacional, mas do... Brasil! Trata-se do Instituto Ayrton Senna.

O IAS acaba de lançar uma iniciativa chamada eduLab21, em parceria com o Insper e a Universidade de Ghent, na Bélgica. É um laboratório destinado a trazer o conhecimento em educação para o século XXI e o conhecimento do século XXI para a área de educação. O polo belga será o responsável pela geração de novos estudos, inicialmente usando inputs das áreas de psicologia, neurociência e economia. 
O polo brasileiro, comandado por Ricardo Paes de Barros, o melhor economista brasileiro de sua geração, terá como responsabilidades a organização do conhecimento gerado (em todo o mundo) e sua implantação e teste em sala de aula.
E aqui a coisa fica mais interessante: como o IAS atende milhões de alunos através de parcerias com secretarias municipais e estaduais de Educação em quase todo o país, o que há de mais avançado nessa pesquisa poderá ser quase que imediatamente testado em campo, em centenas de escolas. Poder realizar experimentos em tantos e tão grandes grupos de alunos é o sonho de todo pesquisador; beneficiar-se do conhecimento de ponta em primeira mão é o sonho de todo bom gestor público. 
O IAS já vinha tomando um papel de liderança internacional na pesquisa do impacto dos aspectos socioemocionais sobre a aprendizagem por meio de uma parceria com a OCDE. Com o eduLab21, não seria surpreendente se virasse a instituição de referência mundial no assunto. Tudo isso sem custar um centavo ao Erário. É quase inacreditável, mas do lamaçal que se tornou a educação brasileira brota uma flor que há de nos orgulhar.

A morte de Ayrton Senna foi um evento traumático para a maioria dos brasileiros acima de 30 anos, entre os quais me incluo. Foi-se num acidente estúpido nosso compatriota que triunfava no mundo das máquinas, da tecnologia de ponta. Seu falecimento institucionalizou o trabalho pelo bem das crianças brasileiras, que Senna fazia de maneira informal e quase escondido. 
O choque da sua morte e o amor de tantas pessoas mundo afora ajudaram seu instituto a obter as doações de pessoas e empresas que até hoje o mantêm operando. Que doce ironia que agora sua irmã, Viviane, comande uma instituição que também tem pinta de líder mundial em uma área que está na ponta do conhecimento.

P.S. Full disclosure: este articulista está em conselhos do Insper e do Instituto Ayrton Senna, de forma não remunerada.


12 de junho de 2015

Revista Veja

SEIS CENAS DE SEXO QUE FIZERAM ATORES SOFRER NO SET






A atriz e cantora Jennifer Lopez assiste ao Fashion Rocks edição 2014, no bairro do Brooklyn, em Nova York (Foto: Jim Spellman/Getty Images)





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Jennifer López não foi a primeira a penar para fazer uma cena de sexo no cinema -- a atriz e cantora bateu a cabeça durante um rala-e-rola de mentirinha no set de O Garoto da Casa ao Lado. Nem a última.


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Ao contrário do resultado que se vê na tela, as cenas não implicam nenhuma intimidade entre os atores, que, para piorar, estão cercados pela equipe de produção do filme. E esses são apenas os mais leves dos constrangimentos que podem afetar o elenco durante as filmagens. Confira abaixo alguns casos realmente desconfortáveis:

Atores que 'sofreram' em cenas de sexo


Adèle Exarchopoulos e Léa Seydoux

Dura sete minutos ininterruptos uma das cenas de sexo entre Adèle Exarchopoulos e Léa Seydoux no longa Azul É a Cor Mais Quente (La Vie d'Adèle), do diretor franco-tunisiano Abdellatif Kechiche. As discussões filosóficas e morais sobre o filme, que foi inspirado em uma história em quadrinhos de mesmo nome, ganharam ainda mais repercussão após as declarações das atrizes sobre o método de filmagem do diretor. Adèle chegou a afirmar que se sentiu explorada e Léa também disse que se sentiu como uma prostituta no set quando teve que fingir orgasmos durante seis horas seguidas com três câmeras voltadas para ela.

12 de junho de 2015
Veja, Entretenimentos

UMA OFICINA DE 3,3 MILHÕES DE ANOS



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O martelo pode ter surgido antes do gênero humano
Na manhã de 9 de julho de 2011, a arqueóloga francesa Sonia Harmand liderava uma expedição para explorar as imediações do lago Turkana, no Quênia. Estudiosa das ferramentas de pedra feitas pelos ancestrais dos humanos modernos, ela suspeitava que pudesse encontrar ali artefatos muito antigos: a datação dos sedimentos vulcânicos que ocorriam na região havia mostrado que eles tinham alguns milhões de anos de idade. Harmand é investigadora da Universidade Stony Brook, em Nova York, e do CNRS, o centro nacional de pesquisas da França. Naquele ano, ela passara a coordenar a missão arqueológica no Quênia iniciada em 1994 por Hélène Roche, sua orientadora de doutorado.
Em meio à paisagem homogênea daquele pedaço da África, frequentado esporadicamente por pastores com suas ovelhas e povos nômades, o comboio de veículos que levava a equipe acabou se perdendo. O grupo parou para se orientar e avistou uma área promissora para prospecção. Minutos depois, arqueólogos do time já haviam notado na superfície dezenas de pedras que pareciam ter sido talhadas de propósito. Só não tinham ideia de que estavam prestes a escavar o mais antigo sítio arqueológico do mundo.
Os resultados da investigação preliminar do sítio, batizado de Lomekwi 3, foram publicados no fim de maio na revista Nature. Os autores sustentam que as peças encontradas durante o trabalho de campo eram lâminas, martelos e outros instrumentos produzidos deliberadamente por uma espécie extinta de primata, possivelmente ancestral do Homo sapiens, há 3,3 milhões de anos, numa época em que o gênero humano nem sequer havia surgido. O material é 700 mil anos mais velho que as mais antigas ferramentas conhecidas até então.
Na escavação de 13 metros quadrados, Harmand e seus colegas encontraram 29 artefatos ensanduichados entre as camadas de cinzas vulcânicas. Recolheram também mais de uma centena de outras prováveis ferramentas encontradas na superfície. Ao menos parte dos objetos achados soltos parece ter pertencido ao conjunto que estava enterrado. Num dos casos, descobriram uma lasca na superfície que se encaixava perfeitamente numa pedra maior que estava embaixo da terra.
A maior parte das 149 peças descritas no artigo da Nature consiste em pedras grandes com as cicatrizes típicas deixadas pela retirada de lascas. Há outras ainda maiores, beirando os 30 centímetros, que faziam as vezes de bigorna, oferecendo uma superfície de apoio para o trabalho de outras ferramentas (elas guardam as marcas dos golpes recebidos).
Falando por telefone de Nairóbi, Sonia Harmand contou que desde o início teve a consciência de que estava diante de um achado importante. “Como estávamos em níveis sedimentares com mais de 2,6 milhões de anos, sabíamos que aquelas eram as ferramentas mais antigas do mundo”, disse a francesa. “Mas estávamos longe de achar que elas teriam 3,3 milhões de anos.”

Aconfecção de ferramentas já foi vista pelos especialistas como um traço que distingue o gênero humano dos demais primatas. A espécie paradigmática dessa transição foi encontrada na Tanzânia no início dos anos 1960 num sítio em que havia também milhares de ferramentas, e foi batizada por isso de Homo habilis. Mas a ocorrência mais antiga que se conhece do “humano hábil” data de 2,8 milhões de anos atrás – meio milhão de anos depois, portanto, das ferramentas de pedra do lago Turkana. Os fabricantes daqueles artefatos definitivamente não eram humanos. Pelo visto, havia martelo antes de haver gente.
O material encontrado pelos arqueólogos não trazia qualquer pista sobre a identidade de seus autores. Os principais suspeitos são os primatas da linhagem que deu origem aos humanos modernos e que estavam circulando à época por aquela região da África (a mesma em que provavelmente surgiu o Homo sapiens muito tempo depois, há coisa de 200 mil anos).
Um candidato natural é o Australopithecus afarensis: fósseis de mais de 300 indivíduos dessa espécie já foram encontradosna Etiópia, Tanzânia e Quênia. Com corpo peludo, braços compridos e rosto simiesco, o australopiteco era bípede e podiachegar a 1,50 metro de altura. O espécime mais emblemático é Lucy, nome dado ao esqueleto parcial de uma mulher que viveu há 3,2 milhões de anos.
Mas o criador das ferramentas pode pertencer também a uma espécie aparentada – oKenyanthropus platyops – conhecida por um único crânio de rosto achatado encontrado no fim do século passado num sítio arqueológico a apenas 1 quilômetro de Lomekwi 3.
Seja qual for sua identidade, quem golpeou aquelas pedras parecia ter a intenção de transformá-las para atender a necessidades específicas. “Acreditamos que a principal finalidade para a qual eles talhavam as pedras era criar bordas cortantes, uma função que não existe em estado natural”, disse numa entrevista telefônica Hélène Roche. As ferramentas, continuou a pesquisadora, serviam provavelmente para algum uso ligado à alimentação, como cortar matéria animal ou vegetal. Mas tudo isso está na esfera da especulação. O grupo conduz uma análise microscópica que pode vir a identificar resíduos de matéria orgânica e trazer pistas sobre como eram usadas.

Oartigo do grupo de Sonia Harmandfoi bem recebido por seus colegas, a julgar pela opinião de especialistas independentes consultados pela imprensa mundial. Ninguém estranhou o achado que recuou em 700 mil anos a história da tecnologia. Parece paradoxal para quem acompanha as discussões dos estudiosos da ocupação das Américas, que brigam pela autenticidade de sítios que antecipariam a presença humana no continente em meros 10 mil ou 20 mil anos. Harmand acha natural que não haja a mesma resistência. “Estávamos preparados para isso”, afirmou. “As ferramentas mais antigas conhecidas até então eram sofisticadas demais para serem as primeiras, e essa descoberta era aguardada.”
Nem todos endossaram completamente os resultados. O pré-historiador francês Eric Boëda, especialista em tecnologia lítica que é colega de Harmand no CNRS e não participou da pesquisa, manifestou ressalvas em relação ao trabalho. “O material é velho e é lascado, isso é inegável”, concedeu. “Mas não há um número suficiente de peças estudadas e as análises não são convincentes.” Boëda se disse insatisfeito com o estudo da sedimentação e das ferramentas, que privilegiou o modo de fabricação, sem investigar suas características funcionais. “Não creio que os argumentos sejam definitivos.”
Parte das lacunas deve ser preenchida com a publicação de novos resultados da pesquisa, que ainda está em curso. “O trabalho da Nature não menciona nada do que encontramos em 2014”, disse Harmand. “Voltamos a campo e achamos muito mais peças, e além disso detalhamos as condições de sedimentação e preservação do sítio”, completou, alegando não poder dar mais detalhes. Em julho, o grupo retoma as escavações em Lomekwi 3. 

12 de junho de 2015
BERNARDO ESTEVES