quinta-feira, 20 de agosto de 2015

AS ILUSÕES DE SEXO, PODER E GLÓRIA



Quando se é moço, a vida se apresenta como um vasto e infinito horizonte, não se enxerga nem se imagina o fim. O fim não existe, nunca chegará. Já quando marcado pelos sinais da velhice, com pouco ou quase nada pela frente, percebe-se que tudo transcorreu estupidamente depressa. Anos se reduziram a poucos momentos, as lembranças se mesclam e se confundem. Junto com algumas alegrias surgem vários arrependimentos.
No rolar da vida a sensação de tempo no jovem difere daquela do velho. Parece que as paixões juvenis conseguem reter o escorrer do tempo, ao contrário, as agruras senis o fazem voar como fumaça em dia de vento. Chega-se ao momento em que a água que parecia estagnada no reservatório do tempo passa a se escoar pelas corredeiras, “sem retorno possível ou espaço para manobras”.
A alteração acontece quando o instinto reprodutivo se acalma, quando o dever de perpetuar a espécie se apazigua. Curioso: passando-se pelo ponto de mutação do acasalamento, certas espécies falecem, suas existências deixam de ter sentido. Já para o homem, substância mais aperfeiçoada, o tempo se acelera, e os dias intermináveis da juventude não se repetem.
DESEJO E LOUCURAS
Na primeira parte da existência o homem é movido pelo desejo da mulher, por ela faz loucuras. Na maturidade persegue com obstinação o poder ou o dinheiro, que é instrumento do poder, e por ele vende a alma. Mais à frente, quando as perspectivas de permanência no planeta se aproximam do nada, aplica suas forças remanescentes para se esmerar da glória – última fantástica ilusão, embora nela se guarde a “sobrevivência virtual” na memória de um mundo que continuará a escaldar outros indivíduos.
A glória alcançada em vida perpetuou Moisés, Alexandre, Júlio César, Augusto, Napoleão, Einstein e raros indivíduos. A glória é de poucos, enquanto o sexo é de todos, e o dinheiro, de muitos.
A glória fala pelas obras do faraó, pelo esplendor dos templos de Michelangelo, nos sorrisos pintados por Leonardo, nos anjos abraçados às nuvens de Rafael, nos cânticos de Dante, nas mágicas harmonias de Beethoven.
Arthur Schopenhauer sintetizou a glória como “o sol que ilumina os mortos… o poente de vida que se converte na aurora da imortalidade”. Mais sutil ainda Shakespeare, olhando para o “abismo” a sua frente: “Senhores, bom dia, apagai as tochas (do mundo)…” A glória que deixava o iluminaria na eternidade.
TRÊS IDADES
Sexo na juventude, poder na maturidade e glória na velhice. Molas que mantêm as engrenagens rodando. Três são as idades. Três, as motivações. Três, os pecados: luxúria, avidez, orgulho; e três, as virtudes: moderação, desapego e humildade.
Raros, e que acabam ignorados, aqueles que desaparecem do cenário na autossuficiência de um enlevo. A evolução nesta terra costuma ser banhada de sangue, passar pela cruz e conduzir a Deus.
Os budistas ensinam que, “aniquilando a vontade e os desejos”, matando o Eu perturbado por sexo, poder e glória, entregando-se apenas ao que há de divino dentro do homem, se terá acesso ao nirvana, morada dos deuses.
Qôlet: “O dia da morte é melhor que o dia do nascimento”; o fim do corpo esgotaria um ciclo penoso, e sua perda daria um descanso sem sexo, que é transitório, sem poder, que é desgastante, e sem glória, que só a Deus pertence.

20 de agosto de 2015
Vittorio Medioli
O Tempo