sexta-feira, 31 de julho de 2015

NOTÓRIOS E FAMIGERADOS



Um colega narrou-me como verídico o fato que resumo a seguir.

O provimento de cátedra na Faculdade de Medicina exigiu do professor Chinaglia a elaboração de uma tese sobre assunto da sua especialidade. Incluiu nela citações de um cientista de fama internacional, atribuindo-lhe o qualificativo famigerado. Este adjetivo constava no Pequeno Dicionário Brasileiro da Língua Portuguesa, predecessor do Aurélio, como significando famoso, dotado de fama, notável, célebre; mas não mencionava o sentido pejorativo – mal afamadoinfame – apesar de ser esta a acepção mais usada na linguagem corrente, talvez a única conhecida pela maioria das pessoas.

A inclusão do adjetivo na tese era uma “casca de banana” proposital, e coube a um dos examinadores, catedrático baiano, protestar enfaticamente contra essa referência pejorativa ao tão renomado cientista. Em sua defesa, Chinaglia declarou-se surpreso com a censura do examinador, em seguida leu todo o verbete no dicionário, que tivera o cuidado de levar consigo. Conquistou a cátedra, mas o troco veio no banquete em sua homenagem. O loquaz professor baiano encerrou sua saudação com estas palavras:

— ... E quando eu chegar à Bahia, vou dizer aos meus amigos que tive a grande honra de examinar e aprovar o famigerado professor Chinaglia.

Por ter dado azo a esse episódio, e principalmente aos comentários que circularam rapidamente, o dicionarista Aurélio julgou conveniente defender-se na edição atualizada, embora sem reconhecer a falha. Se tiver tempo e curiosidade, procure o verbete famigerado e veja a forma habilidosa como ele o fez.

Os significados mais elogiosos ou pejorativos convivem tacitamente numa mesma palavra ou expressão, e muitas vezes só se distingue o sentido intencional observando o tom com que foi usada. O mais ofensivo e infamante xingamento da nossa língua (no inglês, seria bastard) pode gerar uma briga feroz, ou então uma boa gargalhada dos dois interlocutores, dependendo do modo como é dito. E creio que o mesmo acontece em outros países, talvez todos.

Li em um escritor (não me pergunte o nome) que os americanos têm dificuldade para distinguir entre fama e notoriedade. De fato, em dicionários de inglês o verbete notorious inclui significados pejorativos, como também neutros que podem ser tidos como elogiosos: notório, público, evidente, manifesto; desacreditado, de má fama, de má reputação; famigerado (eis a casca de banana do Prof. Chinaglia). Nessa miscelânea de significados, Al Capone e Frank Sinatra seriam igualmente notorious.

Logo depois do atentado contra o presidente Ronald Reagan, noticiou-se que a intenção do criminoso era causar boa impressão a uma famosa atriz de cinema. Qual seria, na imaginação dele, o caminho para esse crime chegar a impressioná-la? Que grosseira distorção mental teria vinculado na cabeça dele uma coisa com a outra? É certo que ele se tornaria notorious, como de fato aconteceu. Mas bastaria esse tipo de notoriedade para ele ser aceito pela atriz? Nunca se sabe, a julgar pelo que afirma o tal escritor. E é bem possível que haja motivações desse gênero entre os serial killers e outros criminosos.

Fama e notoriedade se misturam também na calçada da fama, em Hollywood, onde milhares de lajotas com características especiais exibem depressões, gravadas cada uma pelo pé de um figurão cinematográfico. Famigerados de todos os quilates celebrizaram assim os seus pés. Homenagem estranha, que eu só conceberia para alguém como o Pelé, ou até o Maradona, talvez o governador Pezão. Mas prefiro não discutir se os idealizadores dessa homenagem dão mais valor à cabeça ou à pata...

Se as coisas são assim por lá, não espanta que em Pindorama a confusão de sentidos seja tão generalizada, a ponto de muitos já estarem considerando famigerados todos os políticos, por exemplo. O noticiário dos últimos meses dá ampla base para esse conceito, mas acho muito arriscado generalizar, especialmente quando os famigerados estão no poder.

Diante desse risco, apresso-me em declarar que todos os políticos são famigerados em um sentido, mas nem todos o são também no outro. Deixo assim em paz minha aljava com as flechas, e ao mesmo tempo me protejo contra eventuais aborrecimentos futuros.

31 de julho de 2015
Jacinto Flecha

quarta-feira, 29 de julho de 2015

POR QUE MULHERES SE DEPRIMEM MAIS QUE HOMENS?




De vez em quando surgem filmes, peças e mitos sobre o comportamento feminino. “Mulheres à beira de um ataque de nervos” ou “Mulheres: tudo certo, mas está esquisito”, e por aí vai… O que só demonstra a ignorância masculina no geral com aspectos importantes da natureza feminina. Uma certa complexidade de elementos, que vão dos mais sutis aos mais escancarados, separam os padrões de comportamentos entre homens e mulheres. Sempre militei para que desde a escola, matérias extra-curriculares pudessem ensinar alunos, educadores e pais temas sobre o comportamentos e as relações interpessoais.
Mas chama a atenção o alto índice de depressão em mulheres, algo como 2/3 dos casos. Seria simplista enumerar uma causa para explicar tal fato, mas vale a pena analisar alguns aspectos. Talvez um dos mais relevantes seja o ritmo hormonal feminino, com suas “luas” e marcadores.Afinal, no que seria o mais natural, a cada 28 dias ou quatro luas mulheres têm suas regras e todo desconforto que a menstruação traz.
A cada dez meses lunares, ou 40 semanas, a gestação começa e termina. Na verdade, a natureza feminina é rítmica, oscilante, distinta. Sim, mulheres são de “lua”, e daí? Quem dera se um homem pudesse engravidar, parir, ter menstruação e amamentar. Haveria um risco de acabar a humanidade, pois somos ruins para sentir dor, temos muita força e baixa resistência.
INFLUÊNCIA HORMONAL
Exemplos de relação das angústias e depressões com influência hormonal são a depressão pós-parto, as síndromes da tensão pré-menstrual e a depressão da menopausa. Mas, como não falar da sobrecarga do papel feminino nas últimas décadas, tendo que se desdobrar nas atividades domésticas, educação de filhos, trabalho fora, amantes de maridos e companheiros, fazedora de exercícios escolares com filhos? E, pior, a quantidade de cobranças quando qualquer um desses setores dá trabalho ou vai mal. O tal de “a culpa é da mãe” ou a terceirização das obrigações e deveres de filhos com o tradicional “veja com sua mãe”. Isso sem contar os cuidados com os pais mais velhos, a família original.
Padecer no paraíso é pouco! Levar filho na barriga, depois no peito, no colo e nos ombros o resto da vida. Mas a novela mexicana da saga feminina ainda traz novas aventuras, como a competição por espaço profissional e social, a competitividade entre as mulheres, com vaidades, cobranças, o tal de ter de estar sempre linda, maquiada, cheirosa, gostosa, unhas feitas, cabelos castigados de química e seguindo a moda. E a sexualidade?
Ter que estar disposta como se nas veias tivessem que jorrar a testosterona masculina que exija sexo de qualquer jeito a qualquer hora. E o que dizer das cobranças sociais, culturais e familiares para conseguir o homem ideal, ter filhos saudáveis lindos e educados, cozinhar bem, ser ótima dona de casa, além de ótima profissional, e dividir despesas? Tá bom ou essas pressões descritas justificam parte do desafio de ser mulher em tempos pós-modernos?
VOLTANDO PARA CASA
O que está acontecendo é que muitas que sonharam em ser independentes ou batalhar no trabalho andam voltando para casa, como demonstram estudos recentes. Mas, também, entre os jovens, o aumento do consumo de álcool e drogas entre as meninas é assustador. Vale ressaltar que o organismo feminino é muito menos resistente, e as alterações de comportamento de mulheres bêbadas é bem mais grave e vexaminoso. Como não se deprimir numa realidade como essa?
De tudo resulta a pergunta que não quer calar: o que desejam as mulheres no mundo atual? Ou ainda, uma provocação na melhor das intenções: “estaria no mundo externo ou dentro de si mesmas o prazer, o relaxamento, o amor e a satisfação tão idealizados pelas românticas e sonhadoras? O homem ideal é o que não busca a aparência, o sexo, a exploração das prendas domésticas, mas sim uma companheira que não dependa dele para ser feliz. E sendo, compartilhem tal felicidade e amor!

29 de julho de 2015
Eduardo Aquino
O Tempo

sexta-feira, 24 de julho de 2015

MAIS UM PLANETA IGUAL À TERRA É DESCOBERTO PELA NASA



Tamanho de planeta é muito parecido com a Terra e seu sistema solar é extremamente similar
A diferença é que o novo planeta é 10% mais quente do que a Terra

















A Nasa anunciou nesta quinta-feira (23) que descobriu um “planeta  gêmeo” da Terra, uma “espécie de primo mais velho” do nosso mundo. O tamanho de planeta é muito parecido com a Terra e seu sistema solar é extremamente similar.
A informação foi divulgada pelo administrador associado da agência, John Grunsfeld, que é responsável pela análise dos dados recebidos do telescópio Kepler. A “nova Terra” foi batizada de “Kepler 452B”.
“Os anos no Kepler 452B tem a mesma duração que aqui na Terra e ele está há milhares de anos na “zona habitável” de sua estrela. Isso significa que pode ter hospedado vida sobre sua superfície em um certo momento ou que ainda pode hospedá-la”, destacou Grunsfeld.
Os dados mostrados pelo telescópio apontam que o planeta tem mais de seis bilhões de anos de idade e recebe 10% mais energia de sua estrela do que o nosso território.
Há duas semanas, outro planeta semelhante à Terra teve sua descoberta anunciada pelo equipe que faz pesquisa com o telescópio do Chile, chefiada por um cientista da Universidade de São Paulo.

24 de julho de 2015
Deu na Ansa

quarta-feira, 22 de julho de 2015

KENEMACOLOR




Sistema de cinema a cores criado em 1906 por George Albert Smith e que se tornou no primeiro a ter sucesso comercial.

O Kinemacolor têm a sua origem nas experiências do inventor inglês Edward Turner que patenteou, em 1899, um sistema de imagens em movimento a três cores. Perante dificuldades em obter financiamento para as suas experiências, Turner pediu ajuda a Charles Urban, um americano residente em Inglaterra e importante figura do cinema inglês. Urban ficou entusiasmado com o sistema e ajudou Turner no seu desenvolvimento. Quando este faleceu, em 1903, Urban comprou a patente e pediu ao seu sócio George Albert Smith que continuasse a desenvolver o sistema.

Albert Smith trabalhou no sistema durante três anos, mas a sua complexidade levou-o a simplificá-lo e, assim, desenvolveu um novo sistema que utilizava apenas duas cores (verde e vermelho) na gravação e projecção de imagens. Nascia, assim, o Kinemacolor, que Urban patenteou em Novembro de 1906. No entanto, o sistema ainda necessitou de dois anos de aperfeiçoamento e a sua apresentação pública apenas ocorreu em 1908, numa sessão para jornalistas. Urban decidiu, então, abandonar os restantes negócios cinematográficos que detinha e dedicar-se em exclusivo ao Kinemacolor, tendo formado, em 1909, a Natural Color Kinematograph Company para comercializar o sistema.

Uma vez que a projecção de filmes em Kinemacolor requeria um projector específico, a comercialização do sistema era feita em exclusividade, com preços altos e filmes de qualidade. Assim, o nome Kinemacolor ficou associado a filmes de notícias e actualidades e os anos seguintes foram ricos em eventos monárquicos, que Urban filmou e explorou. Com muita publicidade à mistura, os filmes eram exibidos numa única sala de cinema e esta rapidamente se tornou no local da moda em Londres.

Um dos mais prestigiados filmes rodados em Kinemacolor foi With our king and queen through India, retrato da coroação do Rei George V na Índia. A cerimónia foi filmada por diversas produtoras e quando o filme de Urban estreou já as restantes produções tinham sido exibidas. Pensar-se-ia que o público já não estaria interessado na cerimónia, mas o filme de Urban, com mais de duas horas de exibição e acompanhado por uma orquestra ao vivo, foi um sucesso e tornou Urban num homem rico.

A comercialização do Kinemacolor no estrangeiro seguiu o mesmo modelo de Inglaterra e era também feita em exclusividade, mas o sistema teve fortunas diferentes. Se no Japão o sistema foi um sucesso, principalmente na produção de filmes baseados em peças kabuki, já em França e nos Estados Unidos o Kinemacolor não teve a mesma sorte. Em França, os filmes foram exibidos a preços exorbitantes numa pequena sala de um pouco interessante bairro de Paris e a iniciativa revelou-se um fracasso. Urban ainda tentou remediar a situação alugando uma nova e maior sala de cinema, mas o resultado foi o mesmo e o empresário acabou por perder muito dinheiro. Nos Estados Unidos, a empresa que foi criada para explorar o sistema (Kinemacolor Company of America) também não teve grande sucesso e ficou mais conhecida pelo facto do realizador D. W. Griffith ter comprado os seus estúdios e os planos da abortada produção deThe Clansman, que eventualmente deu origem a O Nascimento de uma Nação. 




Em 1913, William Friese-Greene, que desenvolveu um sistema a cores rival (Biocolour), contestou, em tribunal, a validade da patente do Kinemacolour e ganhou a acção. Como consequência, o sistema ficou à disposição de todos, mas os elevados custos do Kinemacolor, que necessitava de um projector especial e utilizava o dobro da película em relação aos sistemas habituais (32 fotogramas por segundo, em vez dos habituais 16), fez com que não fosse muito utilizado. Urban ainda continuou a comercialização do Kinemacolor, mas o sistema nunca superou os problemas técnicos de que sofria e foi ultrapassado por outros sistemas, nomeadamente o Technicolor.

Embora tenha sido o primeiro sistema de cinema a cores a ter sucesso comercial, o Kinemacolor viveu essencialmente do marketing e nunca foi o sistema de cores reais que o Urban publicitava. À época, o apetite por imagens em movimento em todo o mundo era bastante grande e o público devorava todo e qualquer tipo de filme. Filmes a cores eram ainda mais aliciantes e o marketing que Urban utilizava para publicitar o Kinemacolor permitiu algum sucesso ao sistema. Muito embora o seu fracasso, o Kinemacolor fica ligado à primeira longa-metragem de ficção a cores da história do cinema, o já esquecido The World, the Flesh and the Devil, produzido em 1914.


22 de julho de 2015
chambel.net

TRATADO GERAL DOS CHATOS, O REMAKE

Aqui vai uma livre atualização do clássico
almanaque “Tratado Geral dos Chatos”, que o escriba Guilherme Figueiredo pôs no mundo há mais de meio século. 
Cá estamos com uma nova lista destas criaturas capazes de nos subtrair a paciência e nos deixar tão inquietos quanto as vítimas do Pediculus púbis, como são conhecidos cientificamente os insetos homônimos que atacam as partes mais baixas e indefesas de um cristão de fé.

   Bons e inocentes tempos aqueles em que os chatos se resumiam aos tipos agrícolas,  como o chato-pra-chuchu, ou às criaturas crentes na meteorologia, como os chatos-de-galocha, que já saíam de casa prevenidos contra qualquer enchente, vento ou maré. Haviam ainda os menos ofensivos, como os da espécime aforismática _sempre com uma filosofia de pára-choque na ponta da língua para importunar. 

   
O certo é que eles se multiplicaram como os invertebrados homônimos e hoje dominam o país, os lares, as repartições, os logradouros públicos, as salas de espera...  
Existem os chatos-24 horas, estes vampiros da paciência alheia, como diria o bruxo do Cosme Velho _só para citar outro tipo fenomenal de chato, que é aquele que sempre inicia uma conversa com a inseparável locução “como diria...”

   Enfim, só nos resta ser mais chatos ainda, o que tenho buscado nestas linhas, afinal de contas ainda não nasceu o ser humano capaz de chatear um chato sem que portasse a mesma peçonha. Como perdemos, nesses tempos corretos, o gosto pelo assassínio e maltratos do gênero, sobra a este cabeça-chata que vos impacienta mapear os maçantes mais visíveis e contemporâneos. Ei-los:

   Megasuperultrahype –  O chato mais veloz do Oeste. Trata-se da criatura atualizadérrima nas últimas tendências e apostas do mundinho dos modernos da noite e da mundanidade em geral. Sabe a nova gíria dos clubes de Londres e já baixou no computador a última faixa do DJ paquistanês pós-electro que será a sensação no inverno novaiorquino. Na hora de falar, apresenta-se como um Guimarães Rosa clubber, ninguém compreende um só vocábulo.

   Fêmea sitcom – Aquele tipo metropolitano metido a chique que acha que a vida é um seriado americano, um Sex and City sem fim. Nos salões, principalmente nas bocas-livres, está sempre com um prosseco à mão. Adora vernissages.

   Chatos de época -  Rabugentos,  inconsoláveis, sempre a resmungar pelo borogodó que se foi. Não é uma questão de idade, ataca também raparigas em flor, como as gazelas que fazem um tipo “virgens suicidas” e ouvem Renato Russo e Smiths como se fossem mademoiselles do século XIX.

   Garçonete-cabeça – Aqui encarno um rápido chato de época para lembrar o tempo em que garçom vestia preto e branco, com gravatinha borboleta, o chopp chegava gelado, ele sabia o resultado do futebol e ainda nos servia de ombro para uma dor amorosa de ponta. 
Hoje, nos bares de moda, as garçonetes são lindas, descoladas, podem passar a noite a discorrer sobre cinema coreano, mas o serviço que é bom... nécaras, como diz o meu amigo Sabião Bestunes, o monstro de Sabará.


   Mario de Andrades digitais – Pessoas que escrevem e-mails enormes, como as famosas cartas do modernista paulistano. Esse homem matou muitos pobres e desnutridos carteiros de tanto fazê-los gastar sola de sapato,  pois se correspondia com o país inteiro... 
Embora desse a impressão a cada interlocutor que aquela troca de cartas embutia uma linda e única afinidade eletiva. 

Todos os anos vem à tona um novo carregamento de missivas do gênero. Escreveu para tocadores de coco do Nordeste, índios, mitos amazônicos, gorilas...

22 de julho de 2015
in o carapuceiro

A QUEM INTERESSAR: PAPEL ALUMÍNIO (REPRODUZO INFORMAÇÃO DO LOROTAS POLÍTICAS 1ª. FASE)

PAPEL ALUMÍNIO

 

Roast-Beef
Roast-Beef

Teríamos que chamar o prato assim, por exemplo: “Picanha com alumínio”, pois o alumínio entrará como um algoz invisível na receita. Esta proteção, o polimento, só não acontece dos dois lados, pois é um processo caro que inviabilizaria a comercialização do mesmo. 

O alumínio é altamente tóxico e é comprovadamente o responsável por complicações gerais no funcionamento do nosso organismo e um grande alavancador do Mal de Alzheimer, inclusive fomentando sua aparição precoce. 

Como usá-lo? Além de usá-lo com o lado brilhante voltado para o alimento, deve-se evitar dar mais de uma volta no alimento, pois na segunda volta em diante os líquidos que gravitarem entre as camadas serão poluídos com o alumínio e voltarão impiedosamente para a nossa receita. Assim é importante fazer a finalização em forma de trouxa que deve ficar situada na parte superior, para evitar esta comunicação dos caldos do alimento com a parte ruim do papel-alumínio.

Sobre as panelas de alumínio. Diz Ricardo Penna, escritor e consultor gastronômico: 

“Na minha cozinha é expressamente proibida a areação de panelas na parte de dentro, pois quando isto acontece, toda vez que cozinhamos algo estamos também incorporando o temível alumínio à nossa receita. Quando isto acontece por alguma pessoa desavisada ou quando a panela ou caneca é nova, fervo algumas cascas de ovo na panela cheia de água, para elas liberarem o carbonato de cálcio, que vão impermeabilizar nossa panela, dando a segurança que necessitamos para nós mesmos e para as pessoas que mais amamos; nossa família e nossos amigos”.

A redação investigou mais e, para contrastar com o texto acima, encontrou na revista Superinteressante, de Junho de 2010, o seguinte: 

“Sabe aquela panela de alumínio antiga, que você ganhou da sua avó? Pode usar sem medo: esse é mais um daqueles mitos sem pé nem cabeça. É verdade que as panelas de alumínio podem soltar partículas do metal, principalmente se forem de qualidade inferior. E é fato também que o acúmulo de alumínio (e outros metais) no organismo facilita o desenvolvimento de doenças degenerativas, como os males de Alzheimer e Parkinson. 

Mas a preocupação é desproposital. 
“Pesquisas provaram que a quantidade de alumínio liberada pelas panelas é muito pequena, incapaz de ter esse efeito devastador sobre a saúde”, afirma Daniel Magnoni, cardiologista e nutrólogo do Hospital do Coração e do Instituto Dante Pazzanese, de São Paulo. 
Segundo estudo feito pelo Instituto de Tecnologia de Alimentos, em Campinas, alimentos preparados em panelas de alumínio contribuem com apenas 2% do limite máximo de ingestão diária do metal (1 miligrama por quilo de massa corporal), dose mais do que segura, na avaliação da Organização Mundial da Saúde (OMS)”.

18 de fevereiro de 2013
Anhangüera

Um comentário:

  1. Na verdade a face polida do papel alumínio não recebe tratamento algum. Uma das faces é polida e a outra opaca porque durante o seu processo de fabricação ele passa por rolos até obter a espessura de papel. Porém, quando o alumínio fica muito fino para ser tracionado, a folha é dobrada ao meio para que novas prensagens possam ser feitas. As faces que ficam em contato com os rolos pressores ficam espelhadas e a face que fica em contato com a outra folha fica opaca.

    http://www.youtube.com/watch?v=Us2YuUmqq-I

    O alumínio possui sim uma certa toxidade. Porém ele só é perigoso quando cozinhamos alimentos ácidos, que causam uma corrosão das camadas de alumínio da panela e incorporam o metal ao alimento. Desta forma muito mais perigoso que assar um frango com papel alumínio é cozinhar molho de tomate em panelas de alumínio sem qualquer revestimento. Mexer o alimento com colheres feitas com material mais duro que o alumínio, como colheres de aço, também ajudam a incorporar o metal ao alimento. Prefira as de madeira ou plástico.

    O lado brilhante do papel alumínio deve ficar para dentro quando assamos algo porque esta face reflete de volta o calor irradiado do alimento sob a forma de infravermelho, cozinhando-o mais rápido e utilizando menos energia.

terça-feira, 21 de julho de 2015

EM 10 ANOS, BRASIL PODE TER 75 MILHÕES DE CRIANÇAS OBESAS

UMA EM CADA TRÊS CRIANÇAS ENTRE 5 E 9 ANOS ESTÁ ACIMA DO PESO

OS OBESOS ENTRE OS MENINOS CHEGAM A 16,6%, E AS MENINAS SOMAM 11,8% FOTO: ARQUIVO EBC


O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em parceria com o Ministério da Saúde, fez estudo que revelou que uma em cada três crianças entre 5 e 9 anos de idade está acima do peso recomendado pela Organização Mundial da Saúde (OMS). Os obesos entre os meninos chegam a 16,6%, e as meninas somam 11,8%. Se nada for feito para mudar esse quadro, a OMS estima que, até o ano de 2025, haja 75 milhões de crianças com sobrepeso e obesidade no Brasil.

Um dos fatores que leva a obesidade entre crianças e adolescentes é o consumo de fast-food. De acordo com a gastróloga do CEAV Jr., Vanessa Prado, para introduzir a alimentação saudável na rotina das crianças é necessário que os hábitos comecem desde cedo, e a escola tem papel fundamental.

“Uma das propostas que desenvolvemos na instituição é que os pequenos participem da elaboração de receitas de fácil compreensão e de manuseio rápido, por isso implantamos o projeto ‘Cozinha Experimental’. As crianças colaboram no preparo de doces de abóbora e de batata doce, além de brigadeiro de cenoura. Gelatina de beterraba e sucos em geral também estão incluídos na lista de lanches”, diz Vanessa.

A gastróloga reconhece que é difícil fazer as crianças trocarem as batatas fritas por brócolis, tomate e alface. A solução, segundo ela, está nas cores dos alimentos: o prato deve ser o mais colorido possível.

“Aos poucos os pequenos já sabem que a refeição deve ter, no mínimo, cinco cores. Algumas crianças contam que nunca comeram frutas, e que não gostam de legumes ou de salada verde de jeito nenhum. Mas aos poucos mudam de opinião e pedem refeições como caldo verde de mandioquinha com couve, salada de frutas, tapioca, sucos naturais e espinafre refogado com cenoura”, afirma Vanessa.

O projeto ‘Cozinha Experimental’ é realizado em espaço próprio para a preparação dos pratos.

“Na preparação das ‘bolachinhas amanteigadas’, por exemplo, cabe aos pequenos picar o chocolate. Já as professoras ficam com a tarefa de usar o fogão para derreter o chocolate e assar os biscoitos no forno. O forno, o microondas e o fogão ficam longe do alcance dos alunos”, explica Vanessa, que acrescentou: “Na escola fazemos nossa parte e precisamos que os pais ajudem oferendo alimentos saudáveis em casa também. A beterraba, por exemplo, pode ser inserida em diversas refeições, como com arroz, no suco, na gelatina e refogadinha com outros legumes. É importante que as crianças aprendam a gostar de sabores saudáveis”.



21 de julho de 2015
diário do poder

BEATLES À CARBONARA



Uma cantina que tem dois Lennons



Jonh Lennon tinha até algum talento para a música. Tocava trompete na orquestra da cidade, a pequenina São Miguel, de 23 mil habitantes. Mas, quando o ousado projeto de estabelecer uma filarmônica no interior do Rio Grande do Norte foi interrompido, ele não pensou duas vezes e pegou a estrada. Pôs os pés em São Paulo pela primeira vez aos 18 anos, com uma única mala na mão – e sem o trompete.

Lennon, hoje com 26 anos, tem os cabelos pretos e 1,65 metro de altura. Parece desconfiado e é sério, quase sisudo, com quem não tem intimidade. Ao deixar a música para trás, Jonh Lennon Henrique de Freitas (por engano, o pai e o escrivão trocaram as letras do primeiro nome) já tinha nova ocupação e emprego garantido na capital paulista. Foi trabalhar na tradicional Cantina Gigio, em Pinheiros, por indicação de um conterrâneo seu, Claudenício Dantas, o Dedé, garçom no restaurante.

Seis meses depois, outro Lennon chegava para reforçar o atendimento no salão. John Lennon do Rego Barros, de 23 anos, também é moreno, mas é um pouco menos tímido e bem mais alto do que o colega e ex-trompetista: mede 1,80 metro. Como se não bastasse a coincidência improvável do nome, vinha da mesma cidade, São Miguel. Chegava pelas mãos, mais uma vez, de Dedé, uma espécie de Brian Epstein – primeiro empresário e descobridor dos Beatles – do Gigio.

“Enquanto as pessoas ainda choram a morte de John Lennon, eu tenho dois aqui”, gabou-se José Ailton Gonçalves da Silva, maître da casa. Foi ele, chefe da dupla, quem tomou a primeira e óbvia providência numa situação como aquela: determinou que o precursor, mais baixo e circunspecto, atenderia pelo sobrenome, Lennon. O outro seria o John. “John porque é nome de gente alta, e Lennon de gente baixa”, argumentou, com a confiança de quem prova um teorema.

A dupla acabou ganhando fama entre os fregueses mais assíduos e se tornou uma atração à parte. “Quando descobri que nosso garçom se chamava John Lennon, achei o maior barato e até pedi uma palinha”, brincou o comerciante Rogério Nogueira dos Santos, de 65 anos, que vai à cantina pelo menos uma vez por mês comer nhoque ao molho branco com filé mignon. “O moço fica roxo, coitado; essa gente é muito tímida”, observou Marilene,professora aposentada e mulher do comerciante, balançando as pulseiras douradas.

A piada, que até rendeu risadas da primeira vez, tem sido repetida com alguma frequência. “Eles não se cansam nunca. Tipo, sério, nunca”, comentou sem tirar os olhos do iPhone 6 a neta do casal, Valentina, de 12 anos. “Imagine all the people… que vem aqui e faz essa piada com eles, coitados”, arrematou o advogado Márcio, filho do comerciante e pai quarentão da adolescente. Pelo olhar fixo da mãe e da garota depois do comentário, Márcio parece ter herdado a veia humorística do pai.



Se em São Paulo a homenagem ao músico inglês provoca um ou outro sorriso condescendente, em São Miguel o nome é bastante comum. “Só lá na escola tinha uns dez Johns Lennons. Não entendo por que aqui é notícia”, questionou John, o alto. Os pais dos garçons se tornaram fãs dos roqueiros ingleses quando uma banda se formou na cidade, entre o final dos anos 80 e início dos 90, e passou a fazer apresentações com músicas dos Beatles, além de canções da carreira solo de Lennon. O conjunto animou muitos bailes e emprestou trilha sonora para os namoros de São Miguel.

“Meus pais se conheceram enquanto tocava Imagine. Quando nasci, meu pai quis fazer essa homenagem à minha mãe”, disse John. Ele próprio não se diz fã do quarteto de Liverpool. Tampouco o seu colega de salão. “Gosto de música com letra, que faz a gente pensar, que tem uma história”, explicou Lennon, o sério. “Principalmente das que têm história de amor. Ou sofrimento.” Ele não duvida que as letras dos Beatles tenham lá seu valor – “embora eu não entenda nada” –, mas prefere mesmo ouvir Zé Ramalho ou Roberto Carlos.

John gosta do nome: “Facilita na hora de fazer amigos.” Lennon, nem tanto. O padre da cidade a princípio recusou-se a batizá-lo, sob a alegação enfática de que “isso não é nome de gente”. Acresce que havia chegado aos ouvidos do religioso a desaforada declaração do marido de Yoko Ono de que os Beatles eram “mais populares que Jesus”. Foi preciso pedir a intervenção do avô paterno, católico assíduo e amigo do padre, para que a criança pudesse ser enfim reconhecida pela Igreja.

Lennon pensa em voltar para casa. Mesmo depois de quase uma década em São Paulo, diz que não se acostuma com a cidade. De uns tempos pra cá, anda alimentando o projeto de montar um pequeno negócio em São Miguel. Mas descarta abrir uma filial da cantina paulistana no interior do Rio Grande do Norte. “O povo de lá não come macarrão como os daqui, não.” John se incomoda menos com a vida na capital paulista: “São Paulo é ruim, mas não é tão ruim assim.”

Na cantina, os xarás se dividem em dois turnos, seis dias por semana. Lennon é da “turma que abre”, considerado um benefício entre os funcionários do restaurante. Pega às 10h e fica até as 15h. Depois volta às 17h e trabalha mais três horas. John, por outro lado, é da “turma que fecha”: trabalha das 12h às 15h e das 18h até o último cliente. No intervalo entre as duas jornadas, no meio da tarde, o pessoal faz da cantina um lar improvisado. Brincam, jogam conversa fora e improvisam partidas de futebol no estacionamento. Mas o esporte preferido dos funcionários é mesmo pregar peças e fazer brincadeiras com os novatos.

Em junho, a vítima da vez era um jovem caladão, magro e de cabelo preto, em tudo parecido com John – e não à toa, já que são primos. O novo garçom também é de São Miguel. Mas esse pelo menos não tem nome de Beatle, nem de ex-Beatle ou de qualquer outro músico famoso. Chama-se John Kennedy.


21 de julho de 2015
Juliana Faddul

CORDIALMENTE CARLOS





25 anos de cartas e desencontros com Drummond de Andrade


Sentada na poltrona da sala de sua casa modesta, livro aberto no colo, Helena Maria Vicari, 68 anos, declama: Eis meu pobre elefante/ pronto para sair/ à procura de amigos. A leitura é ritmada e tensa. Vai o meu elefante/ pela rua povoada,/ mas não o querem ver/ nem mesmo para rir. Helena faz uma pausa, ajeita os óculos e passa a mão pelos cabelos tingidos de loiro claro. Mostra com elegância/ sua mínima vida,/ e não há na cidade/ alma que se disponha/ a recolher em si/ desse corpo sensível/ a fugitiva imagem... Emocionada, ela pára no qüinquagésimo sexto dos cem versos de O Elefante. Sem tirar olhos nem dedos das páginas, comenta: "Esse é o meu favorito. Me arrependo de nunca ter dito a ele".

"Ele" é Carlos Drummond de Andrade. Nos últimos 26 de seus 84 anos, Drummond trocou cartas com a professora Helena, de Guaporé, cidade de 20 mil habitantes encravada numa parte menos badalada da serra gaúcha. Ela guarda numa pasta preta, abrigadas em plástico, cerca de sessenta cartas, cartões-postais e bilhetes que o poeta lhe enviou; da correspondência dela para ele, não existe cópia. Há mensagens de Drummond datilografadas, escritas à mão, ilustradas, enfeitadas com rabiscos de canetinhas hidrocor. Ao longo das linhas e dos anos, algumas palavras se repetem: "carinho", "amizade", "gratidão", "paz", "respeitosos abraços". Mas essa relação de dezoito anos - que começou com "Desejando-lhe também um feliz Ano-Novo, com êxito nos estudos, envio-lhe o autógrafo pedido" e terminou com "Uma das alegrias da minha vida é contar com amizades fiéis como a de você, que venceu o tempo e a distância" - nunca foi além do papel. Helena e Drummond nunca se encontraram. "Pedras no meio do caminho", ela diz, sem sorrir com o trocadilho.

Helena conheceu os versos de Drummond por intermédio de Lara de Lemos, poeta e cronista doCorreio do Povo, o maior jornal do Rio Grande do Sul, a quem enviava cartas e poemas na esperança de uma palavra de incentivo. Para retribuir o esforço da jovem de 20 anos, Lara se encontrou com ela em 1960 e lhe apresentou a obra de Drummond. Helena ficou deslumbrada.

Um ano depois, cursando magistério num colégio católico, Helena ouviu de uma das freiras que Cecília Meireles seria eterna e que Drummond, moderno, cairia no esquecimento. Foi o pretexto para escrever ao herói - achou o endereço num almanaque de poesia brasileira, numa seção intitulada "Corresponda-se com os seus poetas". Nessa primeira carta, fez pouco da freira futuróloga: "Minha professora de literatura não gosta do senhor, mas eu o acho o maior do Brasil". Recebeu uma polida resposta datilografada e um cartão com autógrafo.

Helena passou a escrever sempre. Duas datas eram sagradas: a Páscoa e o aniversário do poeta, em 31 de outubro. Em 1962, ela recortou a assinatura de Drummond de uma carta para dar de presente a uma das religiosas. No ano seguinte, Drummond já se permitia algumas confissões: "Continuo sendo homem de Itabira mergulhado na confusão da Guanabara". No mesmo ano, ela viajou à tal Guanabara, com as colegas do curso de magistério. Viu o mar pela primeira vez. "Pensei em visitar o Drummond, mas ninguém quis me acompanhar e também não deixaram que eu fosse sozinha." Em uma carta, Drummond lamentou o desencontro.

Em 1964, depois de um namoro de oito anos, Helena se casou com Jurandir João Vicari, que no começo desconfiou das intenções do poeta: "Ele tinha aquela amante de muitos anos, a Lygia Fernandes. Achei que pudesse estar tentando alguma coisa com a Helena". Com o passar do tempo, o marido se acalmou: "A verdade é que as cartas sempre foram respeitosas".

O tema principal da correspondência costumava ser a própria família Vicari. O primeiro filho de Helena e Jurandir, Bagder, nasceu no mesmo dia do aniversário do poeta. Mereceu de Drummond uma quadrinha: Badger, meu pequenino companheiro/ de signo, sê feliz em teu destino / Amar, servir, cantar é o verdadeiro/ Bem de existir, sob o clarão divino. Os outros filhos, Romaine, Rayane e Glauber (por causa do cineasta baiano), e a afilhada Gisele também tiveram direito a versos drummondianos. Em abril de 1966, um poema para a cidade dos Vicari: Guaporé fica longe do Rio de Janeiro?/ Não./ Guaporé fica perto/ se na Páscoa, fagueiro,/ recebo o voto certo/ e amigo - já adivinho/ da família Vicari/ que me chega pelo ar e me envolve de carinho.

Drummond parecia satisfeito com a relação que haviam construído. Em 1970, escreveu: "Não nos conhecemos pessoalmente, e entretanto nossa amizade perdura, como uma planta viçosa, que vai se tornando árvore de boa sombra". Mas, para Helena, essa proximidade virtual não era suficiente. No ano seguinte, voltou ao Rio, dessa vez com o marido. Foram até o apartamento do poeta, em Copacabana, para uma visita surpresa. Ao chegar, descobriram que a família Drummond havia saído minutos antes, rumo a Petrópolis. O porteiro permitiu que Helena subisse até o hall do apartamento, onde ela deixou um bilhete e o presente que levara: uma espátula de prata com motivos gaúchos.

Se ela insistia em encontrá-lo, era, sim, por amizade, mas Helena tinha também uma vaidade artística e queria vê-la reconhecida. Enquanto o poeta lhe mandava quadrinhas singelas que em nada lembram o Poema de Sete Faces ou A Máquina do Mundo, Helena retribuía com versos de sua própria lavra. Drummond era econômico nos elogios. "Acho você melhor nos poemas curtos, que, aliás, são mais difíceis de fazer." "Ele elogiava, mas não deu um empurrãozinho, então eu fiquei me achando menos", conta ela, que chegou a ter um programa numa rádio local chamadoSempre é Tempo de Poesia, em que lia poemas dos outros, nunca os seus.

Passados dezessete anos desde a carta inicial, Helena venceu a vergonha e telefonou pela primeira vez para Drummond, para lhe dar os parabéns pelo aniversário de 76 anos. Nervosa, mostrou-se bem menos prolixa e mais formal do que nas cartas. "Minha filha, trate-me sem tanta cerimônia", ele disse. "Afinal, nossa amizade é antiga e o tratamento 'senhor' me faz sentir um centenário." Não se deve à memória o fato de Helena se lembrar detalhadamente do que Drummond lhe disse: assim que desligou o telefone, ela pegou um papel e canetinhas hidrográficas e registrou toda a conversa.

Enquanto seus sonhos de ser poeta não decolavam, Helena dava aulas no colégio onde estudara e criava os quatro filhos. Nem no trabalho, nem em casa falava muito das cartas. "Eu nunca tinha visto essa pasta da mãe", comenta Rayane, hoje com 34 anos. E folheia as cartas de décadas protegidas em plástico.

Quando Drummond perdeu a filha, Maria Julieta, em 5 de agosto de 1987, Helena relutou em lhe escrever. "Preferi esperar um momento em que ele não estivesse tão abalado." O poeta morreu doze dias depois. Ela se arrepende: "Talvez uma carta pudesse ter dado um alento a ele. Talvez tivesse feito alguma diferença".


21 de julho de 2015
Emiliano Urbim

segunda-feira, 20 de julho de 2015

O CASTIGO DESABOU DO CÉU




No ranking de acontecimentos de interesse global, violência e morte na Faixa de Gaza costumam ter pontuação baixa. Foram tantas as guerras, intifadas, deslocamentos humanos e territoriais naquele enclave do Oriente Médio que notícias de nova erupção entre palestinos e israelenses parecem já nascer velhas. Não seria diferente em novembro passado. O mundo estava ocupado olhando para a agonia eleitoral de George W. Bush nos Estados Unidos, a condenação à forca de Saddam Hussein, a colisão de dois aviões no céu brasileiro. Foi a imagem da menina Maysa Al-Athamna, envolta no pranto fúnebre de sua gente, que entreabriu, fugazmente, a fresta de interesse por Gaza.

Numa manhã de junho, a base militar de Kerem Shalom, na fronteira de Israel com Gaza, foi surpreendida pelo assalto de um grupo de militantes palestinos. Os invasores tinham conseguido cavar um túnel de 1 km de extensão para chegar até a fortificação. Pior: causaram duas baixas no poderoso inimigo, fizeram um prisioneiro e sumiram com ele. Desde então, o cabo Gilad Shalit, nascido na Galiléia e com dupla nacionalidade (franco-israelense), está seqüestrado. Completou 20 anos e deixou as Forças de Defesa de Israel insones e humilhadas. Estava com uma mão quebrada e tinha um ferimento no ombro quando foi raptado.

Preço inicial do resgate exigido pelos terroristas no dia seguinte: a libertação de todas as mulheres e todos os homens palestinos de menos de 18 anos presos em Israel. Preço adicional, comunicado cinco dias mais tarde: libertação de outros mil prisioneiros palestinos e interrupção dos assaltos militares de Israel contra Gaza, desencadeados pelo seqüestro do soldado.

A essa altura, já estava em curso a Operação Chuvas de Verão, desencadeada por Israel contra um território do tamanho de Belo Horizonte, com uma das populações mais jovens do mundo - 49% dos seus 1,4 milhões de habitantes têm menos de 14 anos. "Os céus desabarão", haviam advertido as autoridades militares, alertando para a integridade física do cabo Shalit. Disparos tombaram sobre Gaza três dias depois do seqüestro do soldado, matando pelo menos 370 palestinos, metade deles civis. Entre eles, a pequena Maysa, de 3 anos.

Foi por volta das cinco e meia da manhã que os primeiros foguetes de 155mm atingiram a localidade de Beit Hanun. Eles acertaram os prédios da Rua Hamad, quase toda ocupada pela extensa parentela dos Al-Athamna. As crianças ainda dormiam e os adultos terminavam de se lavar para a primeira oração do dia. No caos das explosões, cabeças foram arrancadas dos corpos e a rua se transformou num painel de Bosch. "Vi a perna da minha tia Jamila soltar-se no ar", conta Haneen, de 20 anos, que morava num quarto andar. "Tentei socorrê-la, mas ela gritou que eu deveria correr e me salvar."

o final, havia sessenta feridos e dezenove mortos, sendo treze da mesma família. Vinte e quatro horas depois, o taxista Madji Al-Athamna chegava ao necrotério do hospital Kamal Adwan para dar conta das perdas. Anotou, um a um, num maço de cigarros aberto, os nomes dos cadáveres que lhe iam sendo apontados no frigorífico - dois filhos seus, três irmãos, oito primos e sobrinhos. Entre eles, a menina Maysa. Todos foram transportados para seus túmulos em macas ou caixões abertos, exceto Maysa e a caçula do clã, Maran, de 18 meses, carregadas nos ombros da multidão.

Por um fiapo de tempo, os protagonistas dessa longa história de relações marcadas a sangue interromperam a engrenagem. Em Telavive, o pai do soldado ainda em mãos dos palestinos irrompeu no hospital em que se encontravam feridos da Rua Hamad e se encontrou com o palestino Osama Al- Athamna, primo de Maysa. Juntos, pediram o fim da violência. O primo Madji, que havia anotado as perdas no maço de cigarros, considerou a visita respeitosa, um alento.

O governo israelense atribuiu a matança à falha de um componente eletrônico do sistema de lançamento de artilharia, e ordenou a abertura de (mais um) inquérito para apurar responsabilidades. Segundo o primeiro-ministro Ehud Olmert os ataques visavam um laranjal usado pelos palestinos para lançar foguetes caseiros Qassam contra civis do outro lado da fronteira.

Mas a engrenagem já retomou seu ritmo habitual. Na última semana de novembro, foguetes palestinos voltaram a freqüentar quintais israelenses. Uma mulher-bomba palestina foi explodida por uma granada antes de se estourar contra um pelotão de soldados israelenses. Ela tinha 57 anos, era mãe de nove filhos, avó de quarenta netos e estava revoltada com as mortes de Beit Hanun.

"Nossa castanheira está toda florida. Coberta de folhas está ainda mais bonita do que no ano passado. (Maio, 1944)."

Foi condenada à morte a castanheira de 150 anos que se tornou conhecida dos mais de 31 milhões de leitores, em 67 línguas, do Diário de Anne Frank. Vítima de um fungo agressivo, ela terá de ser abatida da frente do sobrado que escondeu a família Frank dos campos de extermínio nazistas por 25 meses. Em 1990, a prefeitura de Amsterdã já havia desembolsado o equivalente a R$440 mil para sanear um vazamento de óleo doméstico que ameaçava destruir as suas raízes. Mais recentemente, uma equipe de botânicos combateu por seis meses o asfixiamento da árvore por outros parasitas.

Prevendo a sua morte, foram feitos três enxertos, e uma nova árvore será plantada no mesmo local. Além disso, a castanheira tem direito a uma sobrevida virtual, através do sítio www.annefranktree. com. No Oriente Médio, poucas vidas recebem tantos cuidados.

20 de julho de 2015
Dorrit Harazim

O DILEMA DE SALTER


Um dos melhores escritores norte-americanos do século XX lidou até o fim com a frustração de não ser famoso

No começo dos anos 70, James Horowitz, um piloto da Força Aérea americana que deixara o emprego para virar escritor, recebeu uma mensagem encorajadora sobre um de seus manuscritos. Roger Angell, editor de ficção da revista The New Yorker, mandou-lhe um bilhete: “Venha ao meu escritório para a gente conversar.”

Alguns anos antes, Horowitz, um judeu nova-iorquino formado pela prestigiosa academia militar de West Point, trocara seu sobrenome para Salter. A reinvenção não era só estética. Ele havia atuado como piloto na Guerra da Coreia, tinha feito amigos no campo de batalha, gostava do que fazia. Não conhecia ninguém no meio literário. Já tinha 32 anos. Precisava do simbolismo de um novo nome. Um pouco como o marinheiro Joseph Conrad, que, aos 36 anos, abandonou os mares para escrever, Salter abandonara os céus.

Ele encontrou-se com Angell no Centro de Nova York, em uma salinha cinzenta. Angell elogiou o conto, disse que tinha gostado muito. “É muito bom mesmo”, disse o editor, “mas eu não posso publicar.” Salter ficou surpreso. Não estava entendendo nada. “Na New Yorker temos duas regras”, Angell explicou. “A primeira é que nunca publicamos contos com obscenidades. A segunda é que nunca publicamos contos sobre a escrita, ou sobre os próprios escritores.”

Salter ficou mal com a rejeição e alguns anos depois contou a história a seu amigo Saul Bellow. Bellow, escritor prestes a ganhar o Nobel – consagrado, rico, em seu quarto e penúltimo casamento –, lembrou-se então de um encontro que tivera com Angell no começo da carreira. Ele procurara o editor da revista para oferecer partes de seu segundo livro, A Vítima. Angell recusou o manuscrito. “Na New Yorker temos duas regras”, ele disse. “A primeira é que nunca publicamos contos com obscenidades. A segunda é que nunca publicamos contos sobre a morte ou sobre os que estão morrendo.”



Como ficcionista, Salter construiu, ao longo de décadas, uma reputação por ser um narrador conciso e lírico, pouco conhecido do grande público, mas admirado – cultuado – por outros escritores e críticos literários. Muitos o colocavam entre os melhores do século XX. O epitáfio que mais circulou depois de sua morte no dia 19 de junho, aos 90 anos, foi uma descrição do jornalista Nick Paumgarten, num perfil de 2013 da mesma revista que não aceitara seu conto décadas antes. No artigo, Paumgarten diz que Salter não é um “escritor de escritores”, mas um “escritor de escritor de escritores” (a writer’s writer’s writer).

Paradoxalmente, quanto mais esse epitáfio circula, mais falso ele se torna. Aindaassim, houve algum excesso de solenidade nas apreciações póstumas sobre Salter na imprensa americana, como se os obituaristas do New York Times e do Washington Post tivessem lido muitas reportagens sobre o escritor, mas não a sua ficção. Ou então leram e não gostaram. Seja como for, os elogios – ao mesmo tempo grandiloquentes e desapegados, como num buscador de sinônimos do Word – parecem mascarar uma verdade um pouco dolorida: Salter dificilmente será, algum dia, um escritor com muitos leitores. Seus interesses são repetitivos e particulares demais; seu manejo de unidades do tempo, que pode mudar de dias a anos no mesmo parágrafo, exige uma atenção obsessiva do leitor; não há ganchos em suas histórias. Como Angell reclamara há décadas, seus personagens frequentemente são escritores, ou artistas, com as ansiedades e preocupações próprias de escritores ou artistas. Salter escreve muito sobre si.

Mas acusar um escritor de ser narcisista é como acusar um pugilista de ser violento. E os supostos defeitos de Salter, no contexto certo, transformam-se em atributos. Sua arte é a de despir, de eliminar o que não é essencial. Suas histórias não possuem tramas elaboradas, às vezes sequer possuem tramas. A ausência não tem a função de abrir espaço para as elucubrações internas dos personagens, como nos modernistas célebres (Proust, Joyce, Mann), mas sim permitir um acúmulo de episódios. A tensão nas narrativas é construída de gestos e pequenos diálogos, fragmentos que parecem vagamente relacionados.

A experiência de ler Salter é mais sensorial do que intelectual. Uma frase ou sequência de frases pode ser lida e apreciada isoladamente, pela estética ou pela concentração de conteúdo, mesmo quando não se trata de aforismo. Ele tem o domínio da frase curta que expressa unidades complexas (um estado de espírito, uma fisionomia, uma época), e às vezes lhe bastam apenas uma ou duas linhas para definir um personagem.

Do seu conto “American express”: “Ela faria qualquer coisa que a mãe não tivesse feito, e viveria exatamente como a mãe viveu, no mesmo tipo de apartamento, nas mesmas cadeiras macias.” Em “Am Strande von Tanger”, descrevendo o protagonista: “Ele está se preparando para a chegada do grande artista que um dia espera ser, um artista no sentido verdadeiramente moderno da palavra, ou seja, sem grandes feitos mas com a convicção pura de sua genialidade.” Em seu livro de memórias, Burning the Days, Salter descreve uma tia: “Ela era calma e lúcida. Tinha a paciência vasta dos insanos.” E sobre os colegas militares, ele diz: “Havia garotos da roça com nomes do tipo Homero e Ulisses, garotos que não eram frívolos e cuidavam bem de seus carros.”

A preocupação com a linguagem é minuciosa, trabalhada. Em uma entrevista para a revista literária The Paris Review publicada em 1993, a mesma na qual ele descreve o encontro com Angell, Salter define-se como um frotteur: alguém que segura a palavra e a esfrega na mão, vira e desvira, testa-a várias vezes antes de colocá-la na página. Faz certo sentido, pois Salter sempre foi um escritor lento. Em seis décadas, publicou apenas seis romances, duas coleções de contos e um livro de memórias – além de alguns poucos roteiros de filmes e um livro de culinária em coautoria com a mulher.

Em “Am Strande von Tanger”, talvez seu melhor conto, um casal de expatriados americanos está em Barcelona, e uma amiga alemã vai visitá-los. O tempo não está firme; ninguém sabe se vai dar praia. Os três finalmente resolvem sair de carro, e depois vagam pela orla. Tomam vinho, conversam. Jantam. Tomam mais vinho. Conversam mais um pouco. O dia termina.

Se a descrição soa banal, é porque é quase impossível descrever um conto de Salter. Na história em questão, só se entende o que aconteceu nas últimas linhas. Não é raro que os contos se resolvam assim, na prorrogação. Mas o efeito é menos de um cubo que se fecha, dando um sentido final à história – como na forma clássica do conto – do que o de um ajuste no globo ocular, no qual os detalhes anteriores ganham densidade e contornos mais nítidos. Ao terminar um conto de Salter, o impulso é voltar ao começo para lê-lo outra vez, lê-lo melhor.



Cada autor que se torna conhecido tem uma resposta psicanalítica própria para lidar com as rejeições do passado. E a New Yorker, pelo que representa nas letras americanas, às vezes é alvo de comportamentos reativos. V. S. Naipaul disse certa vez ao seu biógrafo: “A New Yorkernão sabe nada de escrita. Nada. Escrever um artigo lá é como enviar uma carta pelo correio da Venezuela: ninguém vai ler.” Saul Bellow apontava seu livro As Aventuras de Augie March como a virada de sua carreira, o momento no qual ele parou de tentar provar para os outros e para si mesmo que conseguia escrever “como um colaborador da New Yorker”. Há certa ironia no esperneio. Bellow, Naipaul, Salter: no fim, todos foram pauta da revista ou tiveram seus perfis publicados.

Salter – sem dúvida o menos consagrado desses três – se entristecia por não conseguir deixar de ser um escritor de intelectuais, mas sempre encarou a indiferença do grande público com estoicismo marcial. E sempre pareceu mais digno do que outros no anonimato. Bellow, seu amigo, foi em certo sentido o seu oposto: talvez o mais celebrado escritor americano do pós-guerra, era sensível a críticas menores, enxergava conspirações por todos os lados; parecia achar que nunca era suficientemente admirado. A amizade entre os dois acabou aos poucos. “Não gosto de ser coadjuvante”, Salter disse, quando Paumgarten lhe perguntou sobre o assunto.

A rejeição tem o poder, quando infligida ao longo de uma vida, de cevar misantropia e reclusão. O autor rejeitado encara o reconhecimento tardio como uma chance de se vingar do público, o inimigo malévolo e amorfo. Mas Salter nunca se tornou agressivo ou recluso. Sempre deixou claro que queria ser amado. Aceitava dar entrevistas longas; aceitava fazer noite de autógrafos de seus livros. Em uma das poucas vezes em que foi chamado à tevê, no programa de entrevistas do jornalista americano Charlie Rose, em 2013, dividiu a mesa de debate com editores da Paris Review. Salter não buscava a publicidade, mas admitia que desejava a fama. Quando jovem, conheceu a glória como piloto – e sabia que não era algo menor: queria reproduzi-la na página.

Em uma das passagens de seu livro de memórias, Salter descreve um outono em Nova York, durante o mês em que Truman Capote lançou A Sangue Frio (um livro que ele admirava bastante). Capote havia oferecido uma grande festa na cidade. A lista de convidados não foi divulgada, mas soube-se que eram políticos ilustres, estrelas de cinema, magnatas. Salter acabara de terminar seu terceiro romance, Um Esporte e um Passatempo, e ao passar na frente do hotel com seu carrinho conversível, comprado durante uma temporada em Roma, ele observou as luzes, os holofotes, as mulheres “de ombros de fora, seus vestidos levemente erguidos para que subissem as escadas”. No livro ele descreve a cidade de madrugada, perto do amanhecer, quando as pessoas já estão indo embora da festa: “Na escuridão, o zumbido baixinho dos pneus na rua vazia era como uma fria mão que afaga. A cidade era só o céu que mal reluzia. Meu livro ainda não tinha sido publicado, mas seria. Ele não tinha dimensões, não havia limites para o que ele poderia ser. Estava bem guardado no meu bolso, como uma herança.”

Um Esporte e um Passatempo não se tornou o sucesso que Salter esperava, e vendeu apenas algumas mil cópias. Mas silenciosamente, sem alarde, ganhou leitores ao longo do tempo. Por muitos anos, Salter publicou quase toda a sua ficção em apenas três revistas – Paris Review, Esquire e a extinta Grand Street –, mas os editores dessas revistas tinham um fervor religioso por sua escrita.



Em 2002, já aos 77 anos, Salter teve seu primeiro conto publicado na New Yorker. O título, “Última Noite”, dá nome à coleção final de contos que o autor publicou, embora seu derradeiro trabalho de ficção tenha sido um romance, Tudo que É, lançado em 2013.

“Última Noite”conta a história de um tradutor beletrista, sua mulher e uma jovem amiga do casal. Aos poucos fica claro que a esposa está com uma doença terminal e não quer enfrentar a decadência do seu corpo. Pede ao marido que lhe aplique uma injeção. Os três saem para jantar num restaurante; a vontade da esposa é que sua última noite seja prazerosa, sem grandes percalços.

O conto não é o melhor de Salter. O uso atípico de uma trama é forçado; a reviravolta do final, melodramática; e a prosa, embora concisa como de costume, tem uma limpidez excessiva, como se as frases do autor tivessem sido diluídas com solvente – uma prosa New Yorker, por assim dizer. O parágrafo final vale-se de uma leve ironia e de um cinismo que, em quase qualquer outro escritor em atividade hoje, seria autêntico – menos em Salter. Justo nele, que nunca teve problemas em ser sincero na página, nem medo de soar sentimental, qualidades que escritores mais jovens fadados ao recurso irônico certamente desejam. O texto parece uma capitulação.

Mas há outro simbolismo no conto, que pode ser lido mais generosamente a favor de Salter. Afinal, é um texto sobre a morte, e sobre aqueles que estão morrendo – como no texto recusado de Bellow. O protagonista é um literato, como no manuscrito que Angell rejeitou no começo dos anos 70. E, se não há obscenidades, certamente há referências sexuais, e pelo menos uma menção a seios, algo que – embora já não pelo pudor, mas sim pelo provável medo do clichê – a revista não costuma publicar.

O conto pode refletir tanto o triunfo de um artista que se manteve fiel a seu ideal, como também a capitulação frente à ânsia por ganhar leitores. Esse dilema, que nunca foi trivial para Salter, no final das contas não tem resolução. Talvez as duas leituras do episódio façam sentido; talvez nenhuma. Talvez, como Naipaul sugeriu um pouco absurdamente a seu biógrafo, poucos tenham lido o conto. Talvez Bellow tenha inventado uma anedota só para agradar o amigo magoado. É um fim ambíguo, como os fins das histórias de Salter tendem a ser. Talvez seja melhor terminar assim.


20 de julho de 2015

ALEJANDRO CHACOF