quarta-feira, 8 de abril de 2015

EM NOME DO PAI




O filho seria um fracasso. Era a aposta do pai. A profecia quase se concretizou. Por pouco ela teria sido compartilhada de forma mais ampla. Pelos ingleses e curiosos de pequenos detalhes e tramas no imenso tecido do Império Britânico. Por exemplo, a trajetória de um impulsivo político visionário cujos erros de julgamento eram hereditária reincidência. Mas houve herr Hitler. O patrono da mais insidiosa tirania da humanidade fez uma contribuição por via indireta. Talvez a melhor do psicopata austríaco: criou a oportunidade para o filho Winston demonstrar o engano do pai, o lorde Randolph Churchill (1849-95).

O destino, o que se crê trivial fatalidade, não é na prática, completamente imune ou blindado. Por mais das vezes, está sujeito a dribles improváveis. Thomas Edward Lawrence avança no livroSete Pilares da Sabedoria que nada é antecipadamente gravado na pedra. “Nada está escrito”, lança desafiador o jovem tenente do exercito inglês (Peter O’Toole) quando Ali (Omar Sharif), chefe tribal dos Harith, preveniu em cena de Lawrence da Arábia, filme épico de sir David Lean, que a travessia do inóspito Deserto de Nefud até a cidade costeira de Aqaba, sob domínio otomano, equivalia ao suicídio.

Se um homem decide, apesar de suas fraquezas e adversidades impostas pelas circunstâncias colocar a seu favor os recursos disponíveis e os acumulados durante a sua trajetória, pode sim, reverter o curso da história. Isso Winston Leonard Spencer Churchill fez com estilo sobranceiro e, registre-se, uma vez mais, de forma original que se emparelhada a outras, empalidece as demais. O ex-primeiro-ministro britânico mudou para melhor a história pessoal, a dos seus contemporâneos e deixou legado inspirador para os que vieram após sua morte, 50 anos atrás, dia por dia.

Winston conta ter crescido como uma moedinha de cobre, perdida no bolso do colete de Randolph. Candura de filho com pai, uma figura febril do Partido Conservador britânico cuja carreira foi mais de promessas do que, efetivamente, promissora. Menos atraente que a prosa de Churchill, Nobel de Literatura, justiça se faça, o menino era quase invisível no ponto de vista paterno. Detestado nos internatos dos descendentes da nobreza e herdeiros das fortunas inglesas, em Ascot, Brighton e Harrow, Winston suplicava ao pai para ir buscá-lo nas férias de Natal. Suas cartas ficavam sem resposta.

No entanto, até o fim e de modo recorrente, Winston Churchill — The Last Lion, na trilogia de William Manchester, o mais lúcido e escrupuloso da legião de biógrafos — foi visitado pela visão quimérica do pai. “Hoje é 24 de janeiro, dia da morte de meu pai, data que morrerei também.” Exatos 12 depois, a predição foi consumada — e sucedida por funeral cujas honrarias o Reino Unido só dedicou a Isaac Newton, William Gladstone e aos vencedores do “ogre” Napoleão, no mar (Trafalgar) e na terra (Waterloo), o Almirante Horatio Nelson e o Duque de Wellington.

Corroído pelo sífilis, depois de lenta agonia, permeada por crises de paranóia e alucinações, Randolf Churchill morreu com apenas 46 anos de idade no ostracismo. Winston tinha só 20. Talvez não tenha sido o maior drama. O pai não viu o filho contornar o Eduardo VI e a jovem Elizabeth II para achegar-se ao parapeito central do Palácio de Buckingham e acenar com os dedos em forma de “V” na direção da multidão que, numa troca simbiótica, o aplaudia de modo efusivo.

O pai tampouco acompanhou a reviravolta espetacular para culminar na apoteose. O coturno nazista ocupava praticamente toda a Europa. Onde não subjulgou com a esteira dos Panzer, contava com colaboradores entusiasmados e a resistência contida pelo terror da Gestapo. Hitler tinha como aliados Mussolini e Stalin. Roosevelt, de costas para a guerra na outra margem do Atlântico, parecia mais preocupado com a reeleição. Churchill era um solitário pilar de determinação. No inicio, seu melhor armamento era um arsenal de palavras que entrelaçadas formavam formidável eloquência para mobilizar os povos de língua inglesa contra a tirania. Só palavras? Bem, ele confidenciou a um amigo possuir último recurso na eventualidade do invasor desembarcar nas regiões costeiras das Ilhas Britânicas. “Lutaremos com garrafas quebradas”.

Stefan Zweig explorou com habilidade aspectos secretos dos seus biografados a ponto deles tornarem-se a força motivadora e explicativa de atos e fatos. Trata-se de um percurso perigoso para historiadores rigorosos. O risco de cair no psicologismo é permanente. Mas no caso de Churchill há um consenso até agora sem contraposição satisfatória. A relação com o pai Randolph foi determinante.

Fréderic Ferney acaba de lançar na França um ensaio histórico — e quase literário — inteiramente dedicado à questão, Tu serás un raté, mon fils! (Você será um malogro, meu filho!, em tradução livre). A leitura é desaconselhada para quem procura relato frio e seco de eventos na tábua cronológica. O livro tem mais sabor para quem já foi iniciado, ao menos, por uma biografia de Churchill — há dezenas. Ferney parte do princípio de que uma ferida profunda pode influenciar a formação da personalidade, mas é a sua superação, uma espécie de cura, que tem capacidade de forjar grandes homens. Churchill foi um deles, em nome do pai.

Assista em seguida um ótimo documentário sobre Winston Churchill:


https://www.youtube.com/embed/Nyku1lSRiFU"

https://youtu.be/9q9btbQvQrg

08 de abril de 2015
Antonio Ribeiro

NOVAS VACINAS TÊM RESULTADOS PROMISSORES NO COMBATE AO CÂNCER.


O estudo feito por pesquisadores americanos, foi publicado nesta quinta-feira em uma edição especial da revista 'Science' dedicada aos avanços da imunoterapia



O objetivo da imunoterapia é estimular as células do sistema imunológico 
do paciente para promover a cura
(Thinkstock/VEJA)

Uma nova técnica de imunoterapia, uma vacina personalizada que ataca os tumores, mostrou sinais promissores em três pacientes diagnosticados com melanoma, a forma mais agressiva de câncer de pele. Os resultados dessa abordagem, publicados nesta quinta-feira em uma edição especial da revistaScience que dedica cinco análises aos avanços da imunoterapia, revelam que os pacientes mostraram uma forte resposta imune, capaz de combater a doença.

Para isso, os pesquisadores da Universidade Washington de Saint Louis, nos Estados Unidos, compararam o genoma dos tumores de cada paciente com a carga genética do tecido saudável para identificar as proteínas mutantes do tumor, chamadas neoantígenos. Usando modelos de computador, os cientistas descobriram quais desses neoantígenos poderiam obter respostas mais fortes do sistema imunológico e, a partir disso, fabricaram vacinas para cada indivíduo. No mês seguinte, exames de sangue mostraram que o sistema imune dos pacientes estava respondendo ativamente às mutações.

O grande atrativo da pesquisa é que os cientistas conseguiram, por meio desta nova técnica, conceber vacinas personalizadas, uma abordagem que pode ser promissora no futuro. No entanto, os pesquisadores ressaltam que é cedo para afirmar se ela funciona para combater ao câncer. Neste ano, estão planejados estudos com um número maior de participantes.

"Esse é apenas o primeiro passo. Ainda é necessário acompanhar as respostas desses pacientes por longo prazo, além de ter outros estudos com mais pessoas e para outros tipos de câncer. O mérito desse estudo é que os cientistas conseguiram selecionar com precisão os neoantígenos e mostraram que os pacientes respondem a eles", afirma José Augusto Rinck Jr., médico oncologista do hospital A. C. Camargo. "É mais uma pesquisa a mostrar que a imunoterapia é uma estratégia promissora de combate ao câncer."


Avanço do Ano - O objetivo da edição especial da Science é ressaltar o desenvolvimento científico da imunoterapia e analisar o que precisa ser feito para que ela continue a evoluir e apresentar resultados. De acordo com a revista, há relatos de recuperações "espantosas" descritas nos artigos da edição, que analisam as diferentes técnicas de imunoterapia, como a descrita pelos pesquisadores americanos, e sugerem o que ainda precisa ser feito para que o tratamento se transforme em uma maneira eficaz de combate ao câncer.

O objetivo da imunoterapia, uma estratégia conhecida há mais de cinquenta anos, é estimular o sistema imunológico do paciente para promover a cura. Ela foi classificada como Avanço do Ano pela Science em 2013, quando seus resultados começaram a se tornar mais robustos. Os estudos feitos desde então mostram que o tratamento é capaz de fazer com que pacientes em estágio avançado da doença sobrevivam por mais tempo que o esperado. Há casos de pessoas que chegaram até mesmo a erradicar os tumores.

O melanoma é o tipo de tumor que responde melhor à terapia, mas resultados também têm sido promissores para câncer de próstata, pulmão, rim, bexiga, pescoço e ovários. Em conjunto, as análises da Science desenham um futuro promissor para o tratamento, apesar dos atuais obstáculos, como os efeitos colaterais e sua eficiência ainda para um pequeno número de pessoas.

"A estratégia tem chamado a atenção da comunidade científica em todo o mundo e será o foco de mais da metade dos estudos que serão apresentados este ano na Conferência da Sociedade Americana de Oncologia Clínica, o maior evento da área. Estamos prestando cada vez mais atenção nessas pesquisas e nas novas drogas desenvolvidas, que podem ser uma forma realmente eficiente de combate da doença no futuro", afirma Rinck Jr.

Conheça 11 pesquisas que representam avanços na luta contra o câncer




(Foto: Thinkstock/VEJA)

Nova droga usa o sistema imunológico do paciente para combater o câncer

O que diz a pesquisa: Usando uma substância chamada BMS-936558, cientistas conseguiram usar o próprio sistema imunológico de alguns pacientes contra o tumor que estavam desenvolvendo. Normalmente, o câncer consegue se disfarçar e não ser atacado pelas nossas células de defesa. Um dos métodos utilizados pelas células cancerígenas para passar despercebidas é pela ação de uma proteína chamada PDL1, que se comunica com uma outra proteína presente em nossos glóbulos brancos, a PD1. A nova droga impede essa comunicação, e faz com que essas células de defesa ataquem o tumor.

Como foi feita: O remédio foi administrado a 76 pacientes com câncer de pulmão de células não-pequenas, o tipo mais comum da doença. Em 18% dos casos, o tumor diminuiu ou parou de crescer. De 33 pacientes com câncer nos rins, 27% também responderam ao tratamento, e de 94 que tinham melanoma, 28% apresentaram melhoras.

Porque é importante: A pesquisa ainda é inicial, mas já se mostra promissora – são os melhores resultados conseguidos com algum tratamento de imunoterapia até hoje. Particularmente importantes foram seus efeitos nos pacientes com câncer de pulmão, que sempre se mostraram resistentes a esse tipo de tratamento.

Opinião do especialista: Milton José de Barros e Silva, oncologista clínico do Hospital A. C. Camargo

"É uma pesquisa inicial, mas sem sombra de dúvida bastante estimulante, pelas perspectivas futuras que abre. Seu mecanismo de ação é inteligente e ela apresenta bons resultados preliminares."

"A célula que podia destruir o câncer é o linfócito T. O problema é que quando ela chega no tumor, existe uma substância que desliga o linfócito. O que essa droga faz é se ligar no linfócito e cobrir esse botão de desligar. No entanto, o tratamento não é isento de efeitos colaterais. O sistema imunológico também pode atacar os tecidos saudáveis."

"A área da imuno-oncologia está em franca expansão. Ela não está voltada ao desenvolvimento de drogas contra o câncer, mas em drogas que estimulem o sistema imunológico contra os tumores. Hoje, já temos uma droga deste tipo em uso: a Anti–CTLA-4. Ela já foi aprovada nos Estados Unidos, e está sendo analisada pela Anvisa."



08 de abril de 2015
Veja